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O Livro na Idade Média

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Capa do artigo: O Livro na Idade Média

Lecionário bizantino Jaharis feito em Constantinopla por volta do ano 1100.
Dimensões 36.8 x 29.6 x 12.4 cm.
Museu Metropolitano de Nova York. Número de acesso 2007.286

Peça fundamental para o estudo sempre foi o livro. No período medieval, todavia, sua produção era difícil pois tinha de ser feita manualmente. Afinal a máquina de imprensa de Gutenberg só surgiu no século 15.

Durante a alta idade média a produção de livros esteve restrita aos meios religiosos. Mosteiros por toda a cristandade faziam cópias à mão de livros considerados importantes na época, entre eles estavam às obras clássicas de pensadores da antiguidade como Platão, Aristóteles, Cícero e centenas de outros.

Em um mundo dominado pelo cristianismo, conservar as obras de escritores pagãos era considerado um mal necessário, pois só nelas se encontravam noções essenciais sobre filosofia que contribuíram para o desenvolvimento da teologia cristã. É interessante notar que as bibliotecas dos mosteiros estavam divididas em duas partes, uma para os livros pagãos e outra para os livros cristãos. Isso para facilitar a pesquisa e impedir que os religiosos lessem obras pagãs caso esse não fosse seu desejo.

Em seu completo trabalho sobre o mundo feudal, Mario Curtis Giordani faz um relato de como funcionava o processo de produção de livros nos primeiros séculos do medievo:

Nos mosteiros a sala de trabalho em que os livros eram escritos e decorados chamava-se scriptorium. Esses scriptoria eram de importância e dimensões variáveis.
Cabia a um monge já experimentado, o armarius, dirigir a confecção de livros: zelava pelo aprovisionamento do scriptorium com o material devido, repartia, dirigia e fiscalizava o trabalho dos copistas. (...) O trabalho era executado separadamente em cadernos que reunidos formavam um codex.
As obras originais eram geralmente ditadas a um notário que as grafava em tabletes de cera. A seguir, os copistas do scriptorium passavam-na a limpo sobre um pergaminho. Os tabletes serviam de rascunho e permitiam correções eventuais. Este processo explica a raridade de manuscritos autógrafos dessa época. Quando havia pressa na confecção de um livro, os cadernos eram distribuídos entre diversos copistas. (GIORDANI, 1982 p. 312-313)

Um scriptorium medieval. Ilustração moderna, artista desconhecido.

Os livros eram todos escritos em latim em pergaminhos produzidos com pele de ovelha ou de cabra, e por isso mesmo esse era um produto muito caro. Houve mesmo casos em que os monges rasparam pergaminhos já escritos para escrever obras que considerassem mais importantes. As obras eram escritas em letra cursiva com o uso de pena e tintas pretas e coloridas.

Durante a alta Idade Média os livros eram copiados para permanecerem nas bibliotecas dos mosteiros, onde seriam estudados por clérigos que poderiam vir de qualquer lugar da cristandade para consultá-los. Eles também eram vendidos a pessoas que se interessassem, mas custavam pequenas fortunas e levavam meses para ficarem prontos. Conforme nos conta Will Durant: “Mesmo a Bíblia era muito rara fora dos mosteiros; era preciso um ano para copiá-la e a renda anual de um sacerdote para se poder comprá-la. Poucos eram os clérigos que dela possuíam uma cópia completa.” (2004 p. 811)

Todavia, a partir do século 12 a Europa assistiu a um período de crescimento econômico, estimulado pelo aumento do comércio, florescimento das cidades e fortalecimento das monarquias nacionais. No ramo educacional se viu o surgimento das Universidades européias. O aumento do número de estudantes de teologia, medicina, direito e outros cursos estimularam o crescimento da produção de livros. Sobre isso Giordani constata:

A intensificação do uso do livro nos meios universitários acarreta modificações no material usado para a fabricação, no formato, na escrita e na ornamentação. No que tange ao material, observa-se o aperfeiçoamento do preparo do pergaminho no sentido de obterem-se folhas menos espessas, mais flexíveis e mais brancas do que as anteriores; a técnica do pergaminho estava mais avançada na Península Ibérica. (GIORDANI, 1982 p. 314-315)

Quanto ao formato dos livro, Giordani completa:

(...) reduziram-se sua dimensões, o que facilitou o manejo e o transporte dos manuscritos. As grandes dimensões dos livros mais antigos não provocaram maiores inconvenientes porque os manuscritos produzidos nas abadias via de regra aí permaneciam e só aí eram consultados. (GIORDANI, 1982 p. 314-315)

Outro fato que contribuiu foi o começo da utilização de penas de ganso que facilitou o trabalho de escrita, aliado ao surgimento da escrita minúscula (separada) gótica que fez o processo ficar mais rápido. Le Goff completa:

Diminui a ornamentação dos livros: iluminuras e miniaturas se fazem em série. Embora os manuscritos de Direito continuem freqüentemente luxuosos – os juristas permanecem em geral uma classe rica –, os livros dos filósofos e dos teólogos são os mais pobres, e só excepcionalmente trazem miniaturas. Freqüentemente o copista deixa em branco o lugar das iluminuras e das miniaturas para que um comprador modesto possa adquirir o manuscrito, enquanto um cliente mais rico mandaria pintar os espaços reservados. (LE GOFF, 1989 p.73)

A partir da mesma época o pergaminho vai começar gradativamente a ser substituído pelo papel, graças a influência árabe a técnica de produção a partir da madeira vai chegar primeiramente na Espanha muçulmana. Mas observe, esse foi um processo muito lento, no século 13 ainda existiam reinos que não conheciam o novo material.

Os tradutores medievais

Durante o período que assistiu a decadência do império romano e a formação dos novos reinos, muitas obras sumiram na Europa simplesmente por não serem recopiadas, numa época em que ainda não havia uma estrutura montada para isso. No entanto, essas obras permaneceram salvas nas bibliotecas de Constantinopla e foram estudadas por sábios árabes, que mantinham relações comerciais com o império do oriente muito antes da expansão islâmica. Algumas obras importantes para o desenvolvimento do pensamento medieval também foram escritas pelos próprios árabes, tais como Avicenas e Averróis.

Ilustração medieval de um escriba fazendo uma cópia de um livro. Data e autor desconhecidos.

Quando as universidades começaram a se desenvolver no ocidente muitas dessas obras ainda estavam fora do seu alcance, escritas em árabe ou grego nas bibliotecas do oriente. Foi graças ao trabalho de centenas de tradutores que elas foram transcritas para o latim e assim puderam ser implementadas nos currículos universitários.

Os principais centros de tradução ficavam em áreas onde havia grande contato entre as diversas culturas, principalmente na Espanha muçulmana, nas cidades comerciais italianas e na Sícilia, onde a corte dos reis normandos mantinha intensos contatos com muçulmanos e bizantinos. Papel muito importante nesse contexto foi o dos judeus que se tornaram intermediários entre as duas diferentes culturas, muitas obras foram inclusive traduzidas por eles.

Um fato interessante que podemos destacar é o de que na falta de uma palavra correspondente no latim os tradutores usavam expressões árabes nas traduções, dessa forma muitas palavras de origem árabe acabaram se integrando ao vocabulário europeu, tais como: açúcar, alcova, alface, alfaiate, algoritmo, almanaque, almofada, álgebra, etc.

Escrito originalmente em 20 de novembro de 2009

Foto de membro da equipe do site: Moacir Führ
Escrito por Moacir Führ

Moacir tem 37 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.

Fontes bibiliográficas
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