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Exposição sobre o Egito Antigo no Museu de História Natural Carnegie, em Pittsburgh, Pensilvânia.
Os desenhos de fundo são uma cópia da tumba do artesão Sennedjem.
Um costume que os historiadores têm é o de dividir a História em períodos. O objetivo é fazer com que os eventos do passado sejam mais facilmente compreendidos, além de facilitar o estudo. Dividir o conhecimento em partes é um ato comum em todas as áreas do saber humano, e os historiadores fazem isso identificando certos padrões e, nos momentos onde há uma grande mudança (normalmente grandes alterações políticas), estabelecem o início de um novo período.
O período histórico que conhecemos como Egito Antigo se estendeu por mais de 3 mil anos e, ao longo desse tempo, mais de 350 faraós governaram a região. As divisões criadas pelos historiadores se baseiam em três grandes momentos de auge (Reino Antigo, Reino Médio e Reino Novo) entrecortados por três períodos de declínio (Períodos Intermediários). Essa é a divisão básica, mas ainda existem outros períodos mais obscuros antes do Reino Antigo e posteriores ao 3° Intermediário.
Um dos problemas com relação às datações na História do Egito é o fato de que os antigos egípcios não possuíam um sistema cronológico contínuo, como nós temos a lógica 'Antes e Depois de Cristo'. Todas as datas do calendário egípcio eram registradas a partir do reinado do faraó que estava no poder. Ou seja, nos registros históricos a maior parte das datas está registrada segundo um padrão do tipo "Ano 8 de Seti I". Isso dificulta sobremaneira a elaboração de uma cronologia precisa para as datas, mas a utilização de registros de eventos astronômicos torna possível ter algumas certezas. O historiador Christian Jacq comenta essa questão:
Uma série de cálculos esparsos em documentos egípcios permite, assim, estabelecer referências cronológicas quase seguras, mas que não ultrapassam o Médio Império. De fato, a mais antiga refere-se ao reinado de Sesóstris III. Sabemos que o ano 7 do reinado desse faraó corresponde ao ano 1871 a.C. Em contrapartida, para o período anterior dispomos apenas de hipóteses e argumentos teóricos. Assim, para se datar a primeira dinastia ainda se hesita entre 3200 e 2850 a.C. (p.21)
Nesse artigo começaremos falando do período chamado Dinástico Primitivo, que engloba as três primeiras dinastias. Mas é importante ressaltar que a unificação do Egito ocorreu antes disso, no período conhecido como Pré-Dinástico ou Protodinástico. E ainda antes desses eventos também há um período enorme que compreende a chamada Pré-História da região.
Período: 2920-2575 a.C
Dinastias: 1° a 3°
Destaques: Faraó Djoser e seu ministro Imhotep, o complexo funerário de Saqqara.
A unificação do Egito ainda era precária nessa época, há indícios que sugerem que os faraós das primeiras dinastias tiveram que superar tentativas de separação de algumas regiões. Foi nesse período também que se fixou a escrita hieróglifica, que já vinha sendo desenvolvida em séculos anteriores. Outros progressos técnicos e na organização política ocorreram permitindo que, na 4º Dinastia, o Egito se tornasse uma monarquia plenamente centralizada.
O grande feito desse período foi a construção do imenso complexo funerário de Saqqara, pelo faraó Djoser e seu ministro e arquiteto Imhotep.
Período: 2575-2134 a.C.
Dinastias: 4° a 8°
Destaques: Construção das Pirâmides de Snefru e de Gizé, auge do poder dos Faraós
O Reino Antigo se destaca pela concentração do poder nas mãos do faraó, e pelo aperfeiçoamento nas técnicas da construção de pirâmides. Os responsáveis por esse progresso foram os engenheiros que viveram no reinado do faraó Snefru. Ele construiu três pirâmides (Pirâmide de Meidum, Pirâmide Torta, Pirâmide Vermelha), e ao longo da construção delas o processo foi gradativamente sendo refinado.
Entretanto, a quarta dinastia é mais famosa por ser a responsável pela construção das grandes pirâmides do complexo de Gizé. Queóps, Quéfren e Miquerinos - os responsáveis por sua construção - foram os reis mais poderosos da história do Egito, e isso se refletiu no gigantescos monumentos que foram capazes de construir. A Grande Pirâmide de Gizé, construída pelo faraó Queóps, tinha 146 metros de altura e permaneceu até o século 19 como o monumento mais alto já construído pelos seres humanos.
Período: 2134-2040 a.C.
Dinastias: 9° a 11°
Destaques: Anarquia e descentralização, Heracleópolis x Tebas
A decadência egípcia desse período fica clara pelo declínio nas artes, diminuição da quantidade de registros históricos e falta de grandes monumentos. Ciro Flamarion Cardoso faz alguns comentários sobre a razão do colapso que ocorreu nesse período:
Pesquisas recentes sugerem que o colapso político esteve ligado não só a decadência da autoridade monárquica - grave num país muito mais longo do que largo e cujas regiões se comunicavam exclusivamente pela navegação fluvial, o que facilitava a divisão e o particularismo nas fases em que o governo central se debilitava -, mas também, e talvez principalmente, a uma série de inundações insuficientes, trazendo a fome e a desorganização da economia. (p.59)
Os faraós continuaram a existir, mas eles não possuíam mais o mesmo poder, e os chefes locais (nomarcas) passaram a controlar suas próprias regiões. A descentralização e a luta entre os diversos nomarcas, com o tempo, fez surgir dois grandes poderes, um com capital em Heracleópolis e outro em Tebas.
Período: 2040-1640 a.C.
Dinastias: 11° a 14°
Destaques: Reunificação pelos tebanos, reinados de Sesóstris III e Amenemés III
Também conhecido como "Período Tebano", o Reino Médio começa com a reunificação do Egito pelo rei de Tebas, Mentuhetep II. Ciro Flamarion Cardoso chama esse de "um dos períodos mais brilhantes da história egípcia" (p.63). Grandes obras foram realizadas, principalmente nos templos religiosos de Tebas. Alguns faraós voltaram a construir pirâmides, embora a qualidade inferior delas fique evidente em comparação com as pirâmides do Reino Antigo.
Será nesse período que o poder de Tebas será consolidado, e a cidade permanecerá até o Período Tardio como uma das mais importantes do Egito, não apenas do ponto de vista político mas principalmente religioso, graças aos grandes templos que começaram a ser erguidos nesse período em Karnak e Luxor, e ao fortalecimento dos sacerdotes do culto de Amon. Os historiadores Bob Brier e Hoyt Hobbs comentam:
Durante seu florescimento, a língua egípcia alcançou um nível de refinamento que para sempre a tornou o modelo para uma boa prosa no antigo Egito. A arte alcançou um realismo elegante: pela primeira vez, os rostos do faraó foram mostrados com linhas de cuidado e idade, em vez de idealizados. Os edifícios, embora não tão gigantescos quanto os do Reino Antigo, possuem um refinamento que os tornam inigualáveis. O Egito também montou sérias expedições militares no Sudão, incursões que mais tarde se estenderiam por todo o Oriente Médio. Mesmo mil anos depois, os egípcios olhavam para o Reino do Meio como uma época gloriosa. (MARK, citação de citação, p.25)
Período: 1640-1550 a.C.
Dinastias: 15° a 17°
Destaques: Hicsos, Aváris x Tebas
Ao mesmo tempo, que decaía a autoridade dos faraós da 13° dinastia, um grande número de asiáticos se movia na região do Delta e se estabelecia por lá. Esses imigrantes foram posteriormente chamados Hicsos, significando "reis estrangeiros". Alguns registros antigos falam de uma invasão destrutiva, mas hoje em dia, já se acredita que a chegada dos Hicsos foi lenta e gradual, e eles se firmaram no poder somente quando já haviam feito fortuna com o comércio.
Os Hicsos adotaram a cultura e os costumes egípcios, que eram mais avançados. Sua capital era Aváris, e eles se mantiveram no poder por pelo menos algumas décadas, até que as primeiras tentativas foram feitas para retirá-los. A reunificação do Egito ocorreu novamente sob o comando da cidade de Tebas.
Embora o domínio dos Hicsos tenha realmente causado um certo declínio da cultura, também é verdade que o contato com essa nova civilização trouxe algumas inovações para a sociedade egípcia. Foi deles a importante introdução do cavalo e da carruagem no Egito, ambos tendo sido usados intensamento nos períodos seguintes.
Período: 1550-1070 a.C.
Dinastias: 18° a 20°
Destaques: Era Imperial, Hatshepsut e Tutumés III, Akhenaton, Cartas de Amarna, Tutâncamon, Ramsés II, Vale dos Reis
Barbara Watterson resume bem o sentimento egípcio após a expulsão dos Hicsos:
A partir da invasão dos Hicsos veio a constatação de que, para uma segunda invasão ser evitada, um estado-tampão na Ásia ocidental deveria ser criado; e no cumprimento desta política, os primeiros governantes da 18° Dinastia tomaram as medidas que permitiram ao Egito embarcar em sua era imperial. (MARK, citação de citação, p.60)
Esses novos ideais ficaram demonstrados por uma intervenção militar maior na região da Palestina e Síria, o que eventualmente colocou o Egito em choque com outra potência da época, os Hititas. O contato com outros povos por via pacífica também aumentou muito durante essa época, um exemplo são as famosas Cartas de Amarna, mensagens trocadas entre os faraós egípcios e reis de diversas regiões do crescente fértil. Mas não foi só o contato diplomático que cresceu, o comércio voltou a ser estimulado e uma grande rede burocrática foi criada para gerir todo o material escrito responsável por controlar todas essas relações.
O Novo Reino é o período mais bem documentado da História do Egito, e também é o período que conta com os faraós mais famosos, nomes como Hatshepsut, Tutmés III, Amenófis III, Akhenaton e sua esposa Nefertiti, Tutâncamon, Seti I e Ramsés II, só para citar alguns. Hoje em dia, qualquer pessoa que visita o Egito irá se deslumbrar com as grandes obras arquitetônicas erguidas durante esse período, principalmente os grandes templos, mas os túmulos também são uma atração já que os faraós do Reino Novo começaram a ser enterrados na necrópole de Tebas, o Vale dos Reis.
Período: 1070-712 a.C.
Dinastias: 21° a 25°
Destaques: reis líbios, divisões entre diversas cidades
Esse foi o período intermediário mais longo e ele marcou o início da decadência do reino egípcio. Foram mais de 300 anos de instabilidade política, econômica e social. O período começou quando, após a morte do faraó Ramsés XI, os sacerdotes da cidade de Tebas declararam independência, dividindo o país novamente entre Alto e Baixo Egito. O período também viu a ascensão de reis estrangeiros, da Líbia, que foram relativamente bem aceitos pela população. O 3° Período Intermediário não parece ter sido uma época de muitos conflitos, na verdade, há muitos registros que comprovam que havia boas relações entre as diversas partes do país, e a violência certamente não era endêmica.
Período: 712-332 a.C.
Dinastias: 25° a 30°
Destaques: Reis Núbios, invasões assírias e persas.
O período conhecido como Reino Tardio começou com a invasão dos reis núbios do sul, que conseguiram reunificar praticamente todo o país. As invasões assírias levadas a cabo por Esarhaddon e seu filho, Ashurbanipal tiveram lugar no século 7 a.C. Mas uma nova dinastia egípcia conseguiu unificar o país e expulsar os assírios. Esse seria o último momento da história em que essa civilização foi governada por egípcios.
Durante este período houve um grande afluxo de estrangeiros para o Egito. Os fenícios vieram como comerciantes; Gregos e Carians vieram como mercenários. Imigrantes do Oriente Próximo, Líbia, Egeu, Núbia e outros locais se estabeleceram no Egito. Um novo e simplificado sistema de escrita, chamado demótico, foi introduzido principalmente para documentos escritos. Por outro lado, a arquitetura monumental, a linguagem e os estilos de arte remetiam ao Reino Antigo. Essas tendências arcaizantes também levaram à cópia de numerosas obras do Reino Antigo, a maioria das quais são as únicas cópias sobreviventes hoje. (Theban Mapping Project)
Em 525 a.C. o Egito foi conquistado pelo Império Persa e a partir de então o país seria sempre governado por nações estrangeiras. O domínio persa trouxe algumas novidades, como a introdução do camelo e a construção de um canal ligando o rio Nilo ao Mar Vermelho, mas os persas eram vistos como invasores e sua queda foi comemorada.
Período: 332-30 a.C.
Dinastias: Dinastia Ptolomaica
Destaques: culto de Serápis e Serapeu, farol de Alexandria, domínio grego.
Em 332 a.C. Alexandre, o Grande e seus companheiros macedônios derrotaram o Império Persa. Eles foram vistos como libertadores e Alexandre foi coroado o novo faraó. Entre outros projetos, Alexandre construiu as bases da nova cidade de Alexandria, que seria a nova capital do Egito nos séculos seguintes. Com a morte de Alexandre, o seu império foi disputado entre seus generais, e o Egito caiu nas mãos de Ptolomeu I que fundou uma nova dinastia que governadoria o Egito pelos próximos 275 anos.
É importante destacar que o domínio grego no Egito não foi um acaso do destino. Os gregos já vinham participando do comércio no Egito há muitos séculos, e durante o Período Tardio foi extremamente comum a utilização de mercenários gregos no exército egípcio. Existiam diversas colonias gregas no Egito, da qual podemos destacar Náucratis, e a população grega estava muito bem adaptada a região. Durante esse período pode se observar uma unificação dos estilos arquitetônicos helenístico e egípcio na arte da região. Entre as construções que se destacam estão o Farol de Alexandria e o Serapeu.
A famosa Cleópatra foi a última rainha da Dinastia Ptolomaica. Ao se envolver na guerra civil que estava agitando a República Romana, ela selou o destino do seu país. Seu relacionamento com o general romano Marco Antônio, fez com que ela lutasse ao seu lado contra Otávio. Após a derrota, ambos se suicidaram e o Egito passou a ser uma província romana.
Período: 30 a.C-642 d.C.
Egito passa a ser uma província romana
A conquista romana, de início, não alterou tanto a vida no Egito Antigo. Foi apenas com a ascensão do cristianismo e com os conflitos entre cristãos e politeístas que a civilização egípcia foi gradativamente sendo destruída, principalmente a partir de 380, quando o cristianismo se tornou a religião oficial do Império Romano.
Entretanto, antes disso, os romanos construíram e ampliaram diversos templos no Egito e algumas crenças egípcias se tornaram populares em Roma como, por exemplo, o culto da deusa Ísis.
O Egito permaneceu sendo uma província romana e, posteriormente, parte do Império Romano do Oriente até o ano de 642 d.C quando foi conquistado pelo Império muçulmano.
Moacir tem 37 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.