GIORDANI, Mario Curtis. História dos Reinos Bárbaros. Petrópolis: Vozes, 1970.
Esse livro é dedicado a descrição dos eventos políticos entre os anos de 476 e 800 na Europa Ocidental. O autor Mario Curtis Giordani tem um estilo bem peculiar de escrita e de organização das suas obras. Ele separa totalmente os eventos políticos da questão cultural. A obra em questão é totalmente dedicada aos eventos políticos, e o segundo volume, se dedica a questão cultural, falando de literatura, sociedade, direito, religião e outros temas durante o mesmo período.
Esse livro é dividido em duas partes: a primeira parte (As Invasões) trata da queda do Império Romano do Ocidente. O autor descreve a sociedade e os povos Germanos, as relações entre romanos e bárbaros antes das invasões, a queda do Império (narrando os eventos entre os anos 395-476) e as causas internas e externas das invasões.
A primeira parte finaliza com um capítulo intitulado "O Assalto dos Bárbaros" que descreve os movimentos migratórios de cada um dos principais povos que invadiram o império no século 5 (hunos, alanos, visigodos, ostrogodos, vândalos, suevos, burgúndios, francos, alamanos, bávaros, lombardos, ávaros e anglo-saxões). Nesse capítulo se destacam os visigodos e vândalos, os dois povos que tiveram um papel mais importante na queda do Império do Ocidente, e os dois que saquearam a cidade de Roma em 410 e 455.
Nas palavras do autor:
As invasões são o fato inicial da Idade Média e, consequentemente, devem constituir objeto de acurado estudo e meditação para que se possa penetrar o próprio espírito da civilização que vai nascer. Explica-se assim a necessidade da primeira parte. (p.7-8)

A segunda parte da obra (Os Reinos Bárbaros até a restauração do Império do Ocidente) é descrita abaixo nas palavras do autor:
Nesta segunda parte vamos estudar a sequência dos acontecimentos políticos que, após a desintegração do Império Romano do Ocidente pelos bárbaros germânicos, culminaram com a restauração imperial no dia de Natal de 800. Nesses séculos conturbados é que se forma a Europa Medieval e Moderna com a contribuição da herança greco-romana, de elementos culturais germânicos e com a influência decisiva do cristianismo. (p.119)

Essa segunda parte apresenta uma narrativa mais positivista, focada nos reinados dos principais reis e suas ações. O autor chega realmente a citar cada um dos reis e o que se destacou em seus reinados. É interessante, mas seria muito mais se o autor tivesse focado na identificação de padrões e trabalhado as questões principais que se destacam nesse período, que são as seguintes:
- A política de federados no final do Império do Ocidente e a relação quase patriarcal que passou a existir entre os reinos bárbaros e o Império Romano do Oriente (Bizantino) até a ascensão de Carlos Magno.
- Conflitos entre arianos e católicos que em muitos casos foram essenciais para as disputas dinásticas.
- Lutas dinásticas e constantes movimentos de centralização e descentralização devido ao costume bárbaro de dividir o reino entre todos os herdeiros quando da morte de um rei. Fica claro que o movimento de descentralização foi uma resposta a isso, uma tentativa de criar um cenário de maior estabilidade política.
- O papel que o cristianismo teve no fortalecimento das monarquias bárbaras, há um padrão muito claro: o cristianismo era um sinal da transição do tribalismo para a monarquia.
- A criação de códigos de direitos bárbaros e a nomenclatura dos reis: "rei dos francos" ao invés de "rei da Gália" refletia o caráter da dominação dos bárbaros que eram líderes de seu povo e não do espaço territorial.
Os livros de Mario Curtis Giordani se destacam pelo uso constante de fontes primárias e de muitas fontes secundárias. Citações de outros historiadores recheiam a obra e o autor sempre faz questão de citar as fontes primárias existentes o que, infelizmente, não é um costume da maioria dos historiadores.
Embora algumas partes da obra sejam maçantes, especialmente quando o autor começa a apresentar listas de reis e comentar questões dinásticas, a obra tem muitas qualidades. O livro faz um relato muito interessante especialmente das invasões visigodas e vândalas, e depois apresenta informações fascinantes sobre os reinados de vários reis germanos, especialmente Teodorico o Grande e Carlos Magno. A questão da permanência da ideia de Império Romano no ocidente também é trabalhada muito bem pelo autor, e fica claro o papel que as conquistas de Justianiano tiveram para manter fortalecida a autoridade imperial na Itália.
E, é claro, não podemos ignorar o fato de que, no Brasil, não há uma grande oferta de livros dedicados exclusivamente a esse tema. Realmente acredito que essa seja uma das melhores obras sobre as invasões bárbaras do século 5 e a formação dos reis bárbaros entre o século 5 e 8.
Tenho grandes esperanças para o segundo volume, porque ele é dedicado apenas a civilização, discutindo aspectos da organização administrativa, social, econômica, cultural, religiosa, etc.
Quer mais informações sobre o livro? Confira as fotos da obra e as minhas anotações de leitura nos links acima dessa resenha.
P.S: Demorei um pouco mais do que o normal para ler essa obra porque acabei assistindo as séries O Último Reino e Vikings nas últimas semanas. Recomendo para quem tem interesse no tema das invasões vikings do século 9. A primeira trata da invasão viking a Inglaterra, focando especialmente no ponto de vista dos anglo-saxões ingleses que sofriam as invasões, e a segunda mostra a sociedade normanda e as invasões a Inglaterra e França no século 9, e o personagem central é o lendário Ragnar Lodbrok cujas aventuras aparecem descritas em sagas do século 13. Eu provavelmente escreverei algum tipo de análise sobre essas séries nos próximos meses, quando me voltar para o estudo dos Vikings.
Resenha publicada em 05/09/2020.
Escrita por
Moacir Führ
Moacir tem 33 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.