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Fontes primárias

Fontes primárias de diversos períodos históricos. Sempre que encontrarmos alguma fonte iremos disponibilizá-la aqui, para que todos os interessados por História possam ter o acesso facilitado a esses documentos (essa seção se focará mais nas fontes escritas).

Fala do Trono de 1823

Fontes primárias > Brasil Império  |  938 visualizações  |  4653 palavras  |  8,6 páginas  |  0 comentário(s)

Dom Pedro I em pintura de Simplício Rodrigues de Sá, cerca de 1830. Museu Imperial.

A Fala do trono era um evento no Brasil Imperial (1822-1889) no qual o soberano reinante lia um discurso preparado para a sessão do parlamento, esboçando a agenda do governo para a sessão seguinte. Este evento era frequentemente realizado anualmente. A Fala do Trono de 1823 foi a primeira realizada no Brasil após a independência, com o imperador Dom Pedro I como governante.

Dignos representantes da nação brasileira.

É hoje o dia maior, que o Brasil tem tido; dia em que ele pela primeira vez começa a mostrar ao mundo, que é Império e Império livre. Quão grande é meu prazer vendo juntos representantes de quase todas as províncias fazerem conhecer umas às outras seus interesses, e sobre eles basearem uma justa e liberal constituição, que as reja. Deveríamos já ter gozado de uma representação nacional; mas a nação não conhecendo a mais tempo seus verdadeiros interesses, ou conhecendo-os, e não os podendo patentear, visto a força, e predomínio do partido português que, sabendo mui bem a que ponto de fraqueza, pequenez, e pobreza Portugal já estava reduzido, e ao maior grau a que podia chegar de decadência, nunca quis consentir (sem embargo de proclamar liberdade, temendo a separação) que os povos do Brasil gozassem de uma representação igual àquela, que eles então tinham. Enganaram-se nos seus planos conquistadores, e deste engano nos provém toda a nossa fortuna.

O Brasil, que por espaço de trezentos e tantos anos sofreu o indigno nome de colônia, e igualmente todos os males provenientes do sistema destruidor então adotado, logo que o Senhor D. João VI Rei de Portugal e Algarves, meu augusto pai o elevou à categoria de Reino pelo decreto de 16 de dezembro de 1815, exultou de prazer: Portugal bramiu de raiva, tremeu de medo. O contentamento, que os povos deste vasto continente mostraram nessa ocasião, foi inaudito; mas atrás desta medida política não veio, como devia ter vindo, outra, qual era a convocação de uma assembleia, que organizasse o novo Reino.

O Brasil sempre sincero no seu modo de obrar, e mortificado por haver sofrido o jugo de ferro por tanto tempo antes, e mesmo depois de tal medida, imediatamente, que em Portugal se proclamou a liberdade, o Brasil gritou Constituição Portuguesa; assentando, que por esta prova que dava de confiança a seus pseudo-irmãos, seria por eles ajudado a livrar-se dos imensos vermes, que lhe roíam suas entranhas, não esperando nunca ser enganado.

Os Brasileiros, que verdadeiramente amavam seu país, jamais tiveram a intenção de se sujeitarem a uma constituição, em que todos não tivessem parte, e cujas vistas eram, de os converter repentinamente de homens livres, em vis escravos. Contudo, os obstáculos, que antes de 26 de abril de 1821 se opunham à liberdade brasileira, e que depois continuaram a existir sustentados pela tropa europeia, fizeram com que estes povos, temendo que não pudessem gozar de uma assembleia sua, fossem pelo amor da liberdade, arrastados a seguir as infames cortes de Portugal; para ver se fazendo tais sacrifícios, poderiam deixar de ser insultados pelo seu partido demagógico, que predominava neste hemisfério.

Nada disto valeu: fomos maltratados pela tropa europeia de tal modo, que eu fui obrigado a fazê-la passar à outra banda do rio, pô-la em sítio, mandá-la embarcar, e sair barra-fora, para salvar a honra do Brasil, e podermos gozar daquela liberdade, que devíamos, e queríamos ter, para a qual debalde trabalharíamos por possuí-la, se entre nós consentíssemos um partido heterogêneo à verdadeira causa.

Ainda bem não estávamos livres destes inimigos, quando poucos dias depois aportou outra expedição, que de Lisboa nos era enviada para nos proteger; eu tomei sobre mim proteger este Império, e não a recebi. Pernambuco fez o mesmo, e a Bahia, que foi a primeira em aderir a Portugal, em prêmio da sua boa fé, e de ter conhecido tarde qual era o verdadeiro trilho, que devia seguir, sofre hoje crua guerra dos vândalos, e sua cidade só por eles ocupada, está a ponto de ser arrasada, quando nela se não possam manter.

Eis em suma a liberdade, que Portugal apetecia dar ao Brasil; ela se convertia para nós em escravidão, e faria a nossa ruína total, se continuássemos a executar suas ordens, o que aconteceria, a não serem os heroicos esforços, que por meio de representações fizeram primeiro que todos, a junta de governo de São Paulo, depois a câmara desta capital, e após destas, todas as mais juntas de governos, e câmaras, implorando a minha ficada. Parece-me, que o Brasil seria desgraçado, se eu as não atendesse, como atendi, bem sei, que este era meu dever, ainda que expusesse minha vida; mas como era em defesa deste Império, estava pronto, assim como hoje, e sempre se for preciso.

Mal tinha acabado de proferir estas palavras: Como é para bem de todos, e felicidade geral da nação diga ao povo, que fico: recomendando-lhe ao mesmo tempo, união e tranquilidade, comecei imediatamente a tratar de nos pormos em estado de sofrer ataques de nossos inimigos, até aquela época encobertos, depois desmascarados uns entre nós existentes, outros nas democráticas cortes portuguesas; providenciando por todas as secretarias, especialmente pela do império, e negócios estrangeiros as medidas, que dita a prudência, que eu cale agora, para vos serem participadas pelos diferentes secretários de estado em tempo conveniente.

As circunstâncias do tesouro público eram as piores, pelo estado a que ficou reduzido, e mui principalmente, porque até quatro ou cinco meses foi somente provincial. Visto isto, não era possível repartir o dinheiro, para tudo quanto era necessário, por ser pouco, para se pagar a credores, a empregados em efetivo serviço, e para sustentação da minha casa, que despendia uma quarta parte da de El-Rei, meu augusto pai. A dele excedia quatro milhões, e a minha não chegava a um. Apesar da diminuição ser tão considerável, assim mesmo eu não estava contente, quando via, que a despesa, que fazia, era mui desproporcionada à receita, a que o tesouro estava reduzido, e por isso me limitei a viver como um simples particular, percebendo tão-somente a quantia de 110:000$000 para todas as despesas da minha casa, excetuando a mesada da Imperatriz, minha muito amada, e prezada esposa, que lhe era dada em consequência de ajustes de casamento.

Não satisfeito com fazer só estas pequenas economias na minha casa, por onde comecei, vigiava sobre todas as repartições, como era minha obrigação; querendo modificar também suas despesas, e obstar seus extravios. Sem embargo de tudo, as rendas não chegavam; mas com pequenas mudanças de indivíduos não afetos à causa deste Império, e só ao infame partido português, que continuamente nos estavam atraiçoando, por outros, que de todo o seu coração amavam o Brasil, uns por nascimento, e princípios, outros por estarem intimamente convencidos, que a causa era a da razão, consegui (e com quanta glória o digo), que o banco, que tinha chegado a ponto de ter quase perdido a fé pública, e estar por momentos a fazer bancarrota, tendo ficado no dia, em que o Senhor Dom João VI saiu à barra, duzentos contos em moeda, única quantia, para troco de suas notas, restabelecesse seu crédito de tal forma, que não passa pela imaginação a indivíduo algum, que ele um dia possa voltar ao triste estado, a que o haviam reduzido: que o tesouro público, apesar de suas demasiadas despesas, as quais deviam pertencer a todas as províncias, e que ele só fazia, tendo ficado desacreditado, e exausto totalmente, adquirisse um crédito tal, que já soa na Europa, e tanto dinheiro, que a mor parte dos seus credores, que não eram poucos, nem de pequenas quantias, tenham sido satisfeitos de tal forma, que suas casas não tenham padecido: que os empregados públicos estejam em dia, assim como os militares em efetivo serviço: que as mais províncias, que têm aderido à causa santa, não por força, mas por convicção, que eu amo ajusta liberdade, tenham sido fornecidas de todos os petrechos de guerra para sua defesa, grande parte deles comprados, e outra dos que existiam nos arsenais. Além disto, têm sido socorridas com dinheiro, por não chegarem suas rendas para as despesas que deviam fazer.

Em suma consegui, que a província rendesse 11 para 12 milhões, sendo o seu rendimento anterior à saída de meu augusto pai de seis a sete quando muito.

Nestas despesas extraordinárias entram também fretes de navios das diferentes expedições, que deste porto regressaram para o de Lisboa, compras de algumas embarcações, e consertos de outras, pagamentos a todos os empregados civis, e militares, que em serviço aqui têm vindo, e aos expulsos das províncias por paixões particulares e tumultos que nelas têm havido.

Grandes foram sem dúvida as despesas; mas contudo, ainda se não lançou mão da caixa dos dons gratuitos e sequestros das propriedades nos ausentes por opiniões políticas, da caixa do empréstimo, que se contraiu de 400:000$000 para compra de vasos de guerra, que se faziam urgentemente necessários para defesa deste Império, o que tudo existe em ser, e da caixa da administração dos diamantes.

Em todas as administrações se faz sumamente precisa uma grande reforma; mas nesta da fazenda, ainda muito mais, por ser a principal mola do Estado.

O exército não tinha nem armamento capaz, nem gente, nem disciplina: de armamento está pronto perfeitamente, de gente vai-se completando conforme o permite a população; e de disciplina, em breve chegará ao auge, já sendo em obediência o mais exemplar do mundo. Por duas vezes tenho mandado socorros à província da Bahia, um de 240 homens, outro de 735, compondo um batalhão com o nome de batalhão do Imperador: o qual em oito dias foi escolhido, se aprontou, embarcou e partiu.

Além disto, foram criados um regimento de estrangeiros, e um batalhão de artilharia de libertos, que em breve estarão completos.

Nos arsenais do exército tem-se trabalhado com toda a atividade, preparando-se tudo quanto tem sido preciso para defesa das diferentes províncias, e todas desde a Paraíba do Norte até Montevidéu, receberam os socorros que pediram.

Todos os reparos de artilharia das fortalezas desta corte, estavam totalmente arruinados; hoje acham-se prontos; imensas obras de que se carecia dentro do mesmo arsenal se fizeram.

Pelo que toca a obras militares, repararam-se as muralhas de todas as fortalezas, e fizeram-se algumas totalmente novas. Construíram-se em diferentes pontos os mais apropriados para neles se obstar a qualquer desembarque, e mesmo em gargantas de serras a qualquer passagem do inimigo, no caso de haver desembarcado (o que não será fácil), entrincheiramentos, fortins, redutos, abatises e baterias rasas. Fez-se mais o quartel da Carioca; prepararam-se todos os mais quartéis; está quase concluído o da Praça da Aclamação, e em breve se acabará o que se mandou fazer para granadeiros.

A armada constava somente da fragata Piranga então chamada União, mal pronta; da corveta Liberal só em casco; e de algumas mui pequenas e insignificantes embarcações.

Hoje acha-se composta da nau Dom Pedro I, fragatas Piranga, Carolina e Niterói; corvetas Maria da Glória e Liberal prontas; e de uma corveta nas Alagoas, que em breve aqui aparecerá com o nome de Maceió; dos brigues de guerra Guarani pronto, Cacique e Caboclo em conserto, diferentes em comissões, assim como também várias escunas.

Espero seis fragatas de 50 peças prontas de gente, e armamento, e de tudo quanto é necessário para combate, para cuja compra já mandei ordem. Parece-me que o custo não excederá muito a 300:000$ segundo o que me foi participado.

Obras no arsenal da marinha fizeram-se as seguintes: consertaram-se todas as embarcações que atualmente estão em serviço; fizeram-se barcos, canhoneiras, e muitos mais, que não enumero por pequenos; mas que contudo somados montam a grande número, e importância.

Pretendo que este ano no mesmo lugar, em que se não fez por espaço de treze, mais do que calafetar, lingar e atamancar embarcações, enterrando somas considerabilíssimas de que o governo podia mui bem dispor com suma utilidade nacional, se ponha a quilha de uma fragata de 40 peças, que, a não faltarem os cálculos que tenho feito, as ordens que tenho dado, e as medidas que para isso tenho tomado, espero seja concluída por todo este ano, ou meado do que vem, pondo-se-lhe o nome de Campista.

Quanto a obras públicas, muitas se têm feito. Pela polícia reedificou-se o palacete da Praça da Aclamação; privou-se esta extensa praça de inundações, tornando-se um passeio agradável, havendo-se calçado por todos os lados, além das diferentes travessas, que se vão fazendo para mais embelezá-la. Consertou-se a maior parte dos aquedutos da Carioca e Maracanã. Repararam-se imensas pontes, umas de madeira, outras de pedra; e além disto têm-se feito muitas totalmente novas; também se consertaram grande parte das estradas.

Apesar do exposto, e de muito mais, em que não toco, seu cofre, que estava em abril de 1821 devedor de 60:000$000, hoje não só não deve, mas tem em ser 60 e tantos mil cruzados.

Por diferentes repartições fizeram-se as seguintes obras: Aumentou-se muito a tipografia nacional. Consertou-se grande parte do passeio público. Reparou-se a casa do museu, enriqueceu-se muito com minerais, e fez-se uma galeria com excelentes pinturas, umas que se compraram, outras, que havia no tesouro público, e outras minhas, que lá mandei colocar.

Tem-se trabalhado com toda a força no cais da praça do comércio, de modo que está quase concluído. As calçadas de todas as ruas da cidade foram feitas de novo, e em breve tempo fez-se esta casa da assembleia, e todas as mais, que a ela estão juntas, foram prontificadas para este mesmo fim.

Imensas obras, que não são do toque destas, se têm empreendido, começado e acabado, que eu omito, para não fazer o discurso nimiamente longo.

Tenho promovido os estudos públicos quanto é possível, porém necessita-se para isso de uma legislação particular. Fez-se o seguinte: comprou-se para engrandecimento da biblioteca pública uma grande coleção de livros dos de melhor escolha; aumentou-se o número das escolas, e algum tanto o ordenado de seus mestres, permitindo-se, além disto, haver um sem-número delas particulares: conhecendo a vantagem do ensino mútuo, também fiz abrir uma escola pelo método lancasteriano.

O seminário de São Joaquim, que seus fundadores tinham criado para educação da mocidade, achei-o servindo de hospital da tropa europeia; fi-lo abrir na forma da sua instituição, e havendo eu concedido à casa da misericórdia, e roda dos expostos (de que abaixo falarei) uma loteria para melhor se poderem manter estabelecimentos de tão grande utilidade, determinei ao mesmo tempo que uma quota-parte desta mesma loteria fosse dada ao seminário de São Joaquim, para que melhor se pudesse conseguir o útil fim para que fora destinado por seus honrados fundadores. Acha-se hoje com imensos estudantes.

A primeira vez, que fui à roda dos expostos, achei (parece impossível) sete crianças com duas amas; nem berços, nem vestuários. Pedi o mapa, e vi, que em 13 anos tinham entrado perto de 12.000, e apenas tinham vingado 1.000, não sabendo a Misericórdia verdadeiramente, aonde eles se achavam. Agora com a concessão da loteria, edificou-se uma casa própria para tal estabelecimento, aonde há trinta e tantos berços, quase tantas amas quantos expostos, e tudo em muito melhor administração. Todas estas coisas, de que acima acabei de falar, devem merecer-vos suma consideração.

Depois de ter arranjado esta província, e dado imensas providências para as outras, entendi, que devia convocar, e convoquei por decreto de 16 de fevereiro do ano próximo passado um conselho de Estado, composto de procuradores gerais, eleitos pelos povos, desejando, que eles tivessem quem os representasse junto a mim, e ao mesmo tempo quem me aconselhasse, e me requeresse o que fosse a bem de cada uma das respectivas províncias. Não foi somente este o fim, e motivo, por que fiz semelhante convocação, o principal foi, para que os Brasileiros melhor conhecessem a minha constitucionalidade, o quanto eu me lisonjearia governando a contento dos povos, e quanto desejava em meu paternal coração (escondidamente, porque o tempo não permitia, que tais ideais se patenteassem de outro modo) que esta leal, grata, briosa, e heroica nação fosse representada numa assembleia geral, constituinte, e legislativa, o que, graças a DEUS, se efetuou em consequência do decreto de 3 de junho do ano pretérito, a requerimento dos povos, por meio de suas câmaras, seus procuradores gerais, e meus conselheiros de Estado.

Bem custoso seguramente me tem sido, que o Brasil até agora não gozasse de representação nacional; e ver-me eu por força de circunstâncias obrigado a tomar algumas medidas legislativas; elas nunca parecerão, que foram tomadas por ambição de legislar, arrogando um poder, em o qual somente devo ter parte; mas sim, que foram tomadas para salvar o Brasil, visto que a assembleia, quanto a umas não estava convocada, quanto a outras, não estava ainda junta, e residiam então de fato, e de direito, visto a independência total do Brasil de Portugal, os três poderes no chefe supremo da nação, muito mais sendo ele seu defensor perpétuo.

Embora algumas medidas parecessem demasiadamente fortes, como o perigo era iminente, os inimigos, que nos rodeavam imensos (e prouvera a DEUS, que entre nós ainda não existissem tantos), cumpria serem proporcionadas.

Não me tenho poupado, nem pouparei a trabalho algum, por maior que seja, contanto que dele provenha um ceitil de felicidade para a nação.

Quando os povos da rica, e majestosa província de Minas estavam sofrendo o férreo jugo do seu deslumbrado governo, que a seu arbítrio dispunha dela, e obrigava seus pacíficos, e mansos habitantes a desobedecerem-me, marchei para lá com os meus criados somente, convenci o governo, e seus sequazes do crime, que tinham perpetrado, e do erro, em que pareciam querer persistir; perdoei-lhes, porque o crime era mais em ofensa a mim, do que mesmo à nação, por estarmos ainda naquele tempo unidos a Portugal.

Quando em São Paulo surgiu dentre o brioso povo daquela agradável, e encantadora província, um partido de Portugueses, e Brasileiros degenerados, totalmente afetos às cortes do desgraçado e encanecido Portugal, parti imediatamente para a província, entrei sem receio, porque conheço, que todo o povo me ama, dei as providências, que me pareceram convenientes, a ponto, que a nossa independência lá foi primeiro, que em parte alguma proclamada no sempre memorável sítio da Piranga.

Foi na pátria do fidelíssimo, e nunca assaz louvado Amador Bueno de Ribeira, aonde pela primeira vez fui aclamado Imperador.

Grande tem sido seguramente o sentimento, que enluta minha alma, por não poder ir à Bahia, corno já quis, e não executei, cedendo às representações de meu conselho de Estado, misturar meu sangue com o daqueles guerreiros, que tão denodadamente têm pelejado pela pátria.

A todo o custo, até arriscando a vida, se preciso for, desempenharei o título, com que os povos deste vasto, e rico continente em 13 de maio do ano pretérito, me honraram de Defensor Perpétuo do Brasil. Este título penhorou muito mais meu coração do que quanta glória alcancei com a espontânea, e unânime aclamação de Imperador deste invejado Império.

Graças sejam dadas à Providência, que vemos hoje a nação representada, e representada por tão dignos deputados. Oxalá, que há mais tempo pudesse ter sido; mas as circunstâncias anteriores ao decreto de 3 de junho não o permitiam, assim como depois as grandes distâncias, a falta de amor da pátria em alguns, e todos aqueles incômodos, que em longas viagens se sofrem, principalmente em um país tão novo, e extenso, como o Brasil; são quem tem retardado esta apetecida, e necessária junção, apesar de todas as recomendações, que fiz de brevidade por diferentes vezes.

Afinal raiou o grande dia para este vasto Império, que fará época na sua história. Está junta a assembleia para constituir a nação. Que prazer! Que fortuna para todos nós!

Como Imperador Constitucional, e mui especialmente como defensor perpétuo deste Império, disse ao povo no dia 1º de dezembro do ano próximo passado, em que fui coroado e sagrado, que com a minha espada defenderia a pátria, a nação, e a constituição, se fosse digna do Brasil e de mim. Retifico hoje mui solenemente perante vós esta promessa, e espero, que me ajudeis a desempenhá-la, fazendo uma constituição sábia, justa, adequada e executável, ditada pela razão, e não pelo capricho, que tenha em vista somente a felicidade geral, que nunca pode ser grande, sem que esta constituição tenha bases sólidas, bases que a sabedoria dos séculos tenha mostrado, que são as verdadeiras para darem uma justa liberdade aos povos, e toda a força necessária ao poder executivo. Uma constituição, em que os três poderes sejam bem divididos de forma, que não possam arrogar direitos, que lhe não compitam, mas que sejam de tal modo organizados, e harmonizados, que se lhes torne impossível, ainda pelo decurso do tempo, fazerem-se inimigos, e cada vez mais concorram de mãos dadas para a felicidade geral do Estado. Afinal uma constituição que pondo barreiras inacessíveis ao despotismo, quer real, quer democrático, afugente a anarquia, e plante a árvore daquela liberdade, a cuja sombra deve crescer a união, tranquilidade, e independência deste Império, que será o assombro do mundo novo e velho.

Todas as constituições, que, à maneira das de 1791 e 92, têm estabelecido suas bases, e se têm querido organizar, a experiência nos tem mostrado, que são totalmente teoréticas, e metafisicas, e por isso inexequíveis, assim o prova a França, Espanha; e ultimamente Portugal. Elas não têm feito, como deviam, a felicidade geral; mas sim, depois de uma licenciosa liberdade, vemos, que em uns países já apareceu, e em outros ainda não tarda a aparecer o despotismo em um, depois de ter sido exercitado por muitos, sendo consequência necessária ficarem os povos reduzidos à triste situação de presenciarem e sofrerem todos os horrores da anarquia.

Longe de nós tão melancólicas recordações: elas enlutariam a alegria e júbilo, de tão fausto dia. Vós não as ignorais, e eu certo, que a firmeza nos verdadeiros princípios constitucionais, que têm sido sancionados pela experiência, caracteriza cada um dos deputados, que compõem esta ilustre assembleia, espero, que a constituição que façais, mereça a minha imperial aceitação, seja tão sábia, e tão justa, quanto apropriada à localidade e civilização do povo brasileiro; igualmente, que haja de ser louvada por todas as nações; que até os nossos inimigos venham a imitar a santidade e sabedoria de seus princípios, e que por fim a executem.

Uma assembleia tão ilustrada, e tão patriótica, olhará só a fazer prosperar o Império, e cobri-lo de felicidades; quererá, que seu Imperador seja respeitado, não só pela sua, mas pelas mais nações; e que o seu defensor perpétuo, cumpra exatamente a promessa feita no 19 de dezembro do ano passado, e ratificada hoje solenemente perante a nação legalmente representada.

Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil.

Mais fontes de Brasil Império

Lei Áurea de 1888

Ato Adicional de 1834

Lei Eusébio de Queiroz de 1850

Lei do Ventre Livre (Lei Rio Branco) de 1871

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