FERRILL, Arther. A queda do Império Romano: A explicação militar. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1989.
A queda do Império Romano: A explicação militar, é uma obra do historiador Arther Ferill, que trabalha os eventos que ocorreram nos séculos finais do Império Romano do Ocidente. Esse livro descreve os acontecimentos militares e políticos dos anos entre a ascensão do imperador Dioclesiano (284-305) até a queda do imperador Rômulo Augusto em 476.
O ano de 476 d.C. é normalmente citado como o ano da queda do Império Romano, por ter sido quando ocorreu a deposição do último imperador. Mas muitos historiadores defendem que o Império Romano já estava indo nessa direção há séculos, e que a queda do último imperador não teve grande importância, ela teria sido apenas um evento simbólico, que deu fim a um império que estava se auto destruindo desde o século 2.
O autor começa o livro falando sobre as teorias sobre a queda do Império apresentadas na obra Declínio e queda do Império Romano, de Edward Gibbon, um clássico sobre o tema. E depois fala de vários outros historiadores e suas contribuiçõs ao debate. Um desses historiadores, Alexander Demandt, chegou a publicar uma lista com 210 causas para a queda do império!! O que demonstra como o tópico levanta teorias diversas.
Nessa obra, Arther Ferill defende que o Império Romano do Ocidente caiu devido a razões militares. Segue uma lista de algumas de suas teorias apresentadas no livro:
- a tese de que o Império Romano estava em decadência desde o reinado de Cômodo (180-192) é falsa,
- as teses de que a causa da queda do Império foram econômicas são errôneas,
- a grande responsável pela queda do Império foi a barbarização do exército do ocidente, que levou a degradação da disciplina e do treinamento do exército romano,
- a causa da queda do Império Romano Ocidental foi essencialmente militar,
- outra causa da queda do império foi a política de apaziguamento e criação de confederados (foederati) executada pelo imperador Teodósio (379-395) e pelo general Estilico,
- até o final do século 4, o exército romano do ocidente era superior ao exército do oriente,
- a derrota dos romanos em Adrianópolis nem pode ser considerada como sinal da decadência do ocidente, porque foi uma derrota sofrida pelos exércitos e pelo imperador do oriente,
- o saque de Roma em 410 e outras derrotas em batalha contribuíram para destruir a moral dos exércitos do ocidente,
- o império do ocidente só começou a decair realmente após a conquista da África pelos vândalos (439) e a perda do controle do Mediterrâneo ocidental, antes disso havia possibilidade de recuperação,
- no início do século 5, quando ocorreu a invasão de diversos povos germânicos pelo Reno, um dos fatores que impediu uma resposta forte dos romanos foi a rebelião do general Flavius Claudius Constantinus (407-411) na Bretanha, que se declarou imperador e fez com que boa parte do exército romano da Gália saísse do controle do imperador ocidental.
O livro inicia (capítulo 2) com a apresentação da estratégia de segurança do império no final do século 3. Desde o reinado do imperador Adriano, a política romana havia sido preventiva. Construção de grandes muralhas e fortes em pontos estratégicos nas fronteiras, visavam impedir a invasão de povos bárbaros.
O autor apresenta as mudanças políticas e militares introduzidas pelo imperador Dioclesiano (284-305), e destaca que somente a partir de Constantino a política de segurança nacional foi alterada. O imperador introduziu a política de um exército móvel central, às custas do exército das fronteiras. Essa nova política estabelecia que um grande exército móvel (10 mil homens) ficaria de prontidão para o caso de invasão e, se necessário, se movimentaria até o ponto onde ela teria ocorrido para enfrentá-la. O autor destaca que, embora houvesse um grande investimento na cavalaria, o exército romano sempre se manteve um exército de infantaria, mesmo no Baixo Império.
A partir de então o autor inicia uma narrativa sobre os eventos que se seguiram, descrevendo as guerras e lutas políticas nos reinados dos filhos de Constantino, de Juliano o Apóstata, e de todos os imperadores que seguintes até a deposição de Rômulo Augusto em 476. Nessa parte o livro se torna um pouco mais maçante, pois o autor adota um estilo de pura história narrativa.
Algumas batalhas recebem uma análise mais profunda pelo autor: a campanha de Juliano o Apóstata na Pérsia (362-363), a batalha de Adrianópolis (378), a batalha do Frígido (394), a batalha de Pollentia (402) e a batalha dos Campos Cataláunicos (451).
O período entre o fim do reinado de Teodósio (395) até a queda em 476 recebe um destaque especial. O autor dá muita ênfase para o reinado de Honório, a relação de Estilico e Alarico, e as consequências da invasão do Reno em 406-407.
Eu gostei bastante do livro, especialmente porque o Baixo Império (284-497) é um período extremamente mal trabalhado pelos historiadores. A maioria dos livros de Roma Antiga simplesmente ignora o Baixo Império, não só porque os historiadores acham muito mais interessante o período republicano e o Principado, mas porque as relações políticas do Baixo Império realmente se tornam muito mais complexas, e a civilização romana passa por muitas mudanças. Esse é um período bastante confuso, e além disso, as fontes são mais limitadas.
Pessoalmente, não concordo com a principal tese defendida pelo autor: de que a causa da queda do império foi essencialmente militar. Arther Ferill frisa muito essa questão, mas acho que seus argumentos são fracos. Embora eu concorde que a barbarização do exército tenha tido um papel fundamental para a queda, acho que essa barbarização foi resultado de uma questão econômica. Então a barbarização não seria a causa primordial, mas uma das consequências da verdadeira causa: a decadência econômica. O autor até toca nesse ponto, negando a importância das razões econômicas mas, de novo, não apresenta bons argumentos.
Mesmo assim, essa é uma obra muito boa sobre a situação militar do ocidente no Baixo Império. Recomendo a leitura!
Resenha publicada em 28/04/2020.
Escrita por
Moacir Führ
Moacir tem 35 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.