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Alexandre, o Grande segundo ilustração moderna de Angus McBride.
A maioria de nós já está familiarizada com a história de Alexandre, o grande, e como suas incríveis conquistas destruiram o Império Persa e levaram ao desenvolvimento da civilização helenístisca. Com uma série de batalhas travadas durante um período de 11 anos (entre 334 e 323 a.C.), os macedônios liderados por Alexandre se tornaram líderes de um dos maiores impérios da antiguidade.
Mas quando o assunto é Alexandre, muitos detalhes costumam não ser discutidos, algumas vezes pelas próprias limitações das fontes, outras por uma escolha dos historiadores, que decidem fazer uma análise puramente narrativa focando nas grandes batalhas.
Nesse artigo comentaremos algumas dessas questões pouco discutidas, que foram trabalhadas no livro de Pierre Briant sobre o tema.
Muitas vezes ao tratar das batalhas que levaram a conquista do Império Persa, os livros se focam nas grandes batalhas de Granico, Isso e Gaugamela, as três grandes derrotas do exército persa; e esquecem de mencionar os primeiros anos da conquista e todas os conflitos que ocorreram antes do avanço final sobre os domínios persas.
Os planos de Alexandre para a conquista se baseavam primeiramente na destruição da marinha persa. Isso porque os macedônios sabiam que, para dominar uma região tão vasta, precisariam de uma linha bem protegida para o recebimento de reforços e suprimentos. Além disso, precisavam garantir que não seriam atacados pela retaguarda ao adentrar a região da Mesopotâmia, onde ficava a grande cidade da Babilônia, casa do imperador persa.
As primeiras batalhas se concentraram na Ásia Menor e região da Síria, Palestina, Fenícia e Egito. Esses dois últimos eram os grandes responsáveis por providenciar os barcos e tripulações para a marinha de guerra persa.
Na Fenícia, a maior parte das cidades não se opôs aos macedônios e recebeu permissão para continuar com suas instituições tradicionais. A única grande resistência veio da cidade de Tiro, na qual um grande cerco teve que ser levantado durante sete meses para que a cidade fosse finalmente conquistada.
Parte do exército macedônio também conquistou ilhas estratégicas no Mar Egeu com o objetivo de destruir bases marítimas usadas pelos persas. Segundo nos relata Briant:
Ao mesmo tempo, a frota macedônia continua a reconquista das ilhas e cidades ocupadas pelos persas em 333 a.C. (Chios, Lesbos...). Em novembro de 332 a.C. o almirante macedônio consegue chegar até Alexandre para lhe fazer um relatório e lhe entregar os tiranos pró-persas. (p.18)
Desde a batalha de Leuctras em 371 a.C. Esparta estava em total decadência, sendo apenas uma sombra daquilo que havia sido no seu auge durante as Guerras Médicas e durante a vitória na Guerra do Peloponeso. Dentro da própria Grécia ela não representava mais uma grande força.
Mesmo assim os espartanos permaneciam teimosos e isolados. A cidade havia se negado a fazer parte da Liga de Corinto, uma aliança fundada pelos macedônios entre todas as cidades de cultura grega (lideradas pela própria Macedônia, óbvio).
Durante a invasão da Ásia, uma guarnição macedônia havia permanecido na Grécia para reprimir possíveis rebeliões. Alexandre também havia tomado a precaução de levar alguns milhares de soldados gregos para a Ásia. O próposito deles parece ter sido mais servir como refém, para garantir que os gregos se comportassem, do que realmente contribuir na guerra de conquista.
Mesmo assim acredita-se que muitos dos favores feitos por Alexandre às cidades gregas durante sua campanha, eram resultado de sua preocupação com a situação política na Grécia, onde os macedônios possuíam aliados, mas não eram de forma alguma uma unanimidade.
Mas a revolta que Alexandre tanto temia veio, não dos membros da Liga de Corinto, mas dos espartanos. Em 331 a.C. os espartanos liderados pelo rei Ágis III aproveitaram o início de uma revolta contra os macedônios na Trácia, para deflagrar uma rebelião no sul da Grécia. Os espartanos chegaram inclusive a derrotar o primeiro exército macedônio responsável pela sua repressão, mas no mesmo ano acabaram sendo vencidos por um segundo exército em Megalópolis.
Durante essa revolta ficou claro que Alexandre temeu que os membros da Liga de Corinto pudessem se juntar ao movimento:
Alexandre acompanhava com preocupação os acontecimentos peloponesianos e tomou medidas para lutar contra Ágis. Na primevera de 331 a.C., em Tiro, para felicitar Atenas e encorajá-la na via da não intervenção, consentiu finalmente que fossem libertados os mercenários atenienses feitos prisioneiros em Granico (...) antes de se dirigir ao Eufrates, deu a Antíparo a ordem de transigir (provisoriamente) com Memon e se colocar contra Ágis. Antíparo contratou contingentes da Liga de Corinto; a batalha aconteceu em outubro de 331 a.C., sob os muros de Megalópolis; os espartanos foram vencidos, e o rei Ágis perdeu a vida. (...) a revolta de Ágis certamente suscitou em Alexandre preocupações sobre a solidez de suas bases européias. (p.50-51)
A prática de capturar reféns para garantir que regiões dominadas, ou estados vassalos, se mantivessem submissos, era muito comum na antiguidade. O próprio Filipe, pai de Alexandre, viveu durante muitos anos na cidade de Tebas como um refém. Foi lá que aprendeu muitas das táticas que, mais tarde, usaria para transformar os macedônios na grande máquina de guerra de seu tempo.
Alexandre manteve essa prática e, durante seu tempo fora da Grécia, manteve contingentes de soldados gregos para garantir que suas cidades de origem se comportassem, conforme afirma Briant:
(...) a mobilização dos contingentes gregos respondia também ao desejo de Alexandre de se assegurar da tranquilidade dos Estados gregos. Ou seja, que os contingentes aliados eram, nem mais nem menos, reféns nas mãos de Alexandre. (p.34)
Isso também foi feito durante as conquistas na Ásia, conforme o exército macedônio se movia cada vez mais em direção ao leste, novos contingentes de soldados regionais eram recrutados e mantidos como reféns, para evitar possíveis revoltas enquanto o grosso dos exércitos macedônios se ausentava. Segundo fontes antigas, mais de 30 mil jovens tiveram que se apresentar para essa função.
A longo prazo, acredita-se que Alexandre visava a criação de um exército misto, composto por tropas orientais e macedônias. Os soldados recrutados deveriam aprender a língua grega e métodos de guerra dos conquistadores. Esse desejo nunca foi uma unanimidade entre os próprios macedônios, e a vida curta de Alexandre não permitiu que esses planos se concluíssem.
Ainda essa semana trarei mais artigos sobre as guerras de Alexandre. Fiquem ligados!
Moacir tem 37 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.