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Constantinopla em reconstrução moderna. A frente o espaço conhecido como Augustaion, uma praça cercada por colunas do lado sul da Igreja de Santa Sofia, que é vista ao fundo.
Esse é um novo tipo de formato de texto que estou inaugurando no site. A partir de agora, toda vez que eu fizer a leitura de um livro, irei trazer um texto com as citações mais interessantes que encontrar.
Esse tipo de texto permitirá que nossos visitantes possam experimentar um pouco o estilo de escrita do autor e também fornecerá citações que podem ser utilizadas em outros textos e trabalhos acadêmicos.
A Civilização Bizantina é um livro escrito pelo escritor inglês Steven Runciman sobre o Império Romano do Oriente, também chamado de Império Bizantino. Veja mais informações sobre o livro aqui.
Como citar esse livro:
RUNCIMAN, Steven. A Civilização Bizantina. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1961.
A mais duradoura das reformas de Diocleciano foi a menos tangível — a intensificação da majestade imperial. O conceito da divindade do rei era endêmico no Oriente e estivera em moda na época das monarquias helênicas. Não desaparecera nunca nas províncias orientais do império: o imperador herdava uma parte da divindade. Mas Roma, com seu tradicional ódio aos reis, não aprovava isso. Augusto teve, portanto, cautela ao não dar mostras de majestade. Era apenas o primeiro cidadão do império, um ser humano que, embora importante, era acessível. Cedo considerou-se que seria bom para os povos vassalos se os imperadores mortos fossem deificados; o verdadeiro romano, porém, aprovou o discurso cínico de Vespasiano agonizante. Apesar da adulação exigida por Domiciano ou por Heliogábalo, essa atitude persistiu no Ocidente, e a possibilidade de uma morte súbita, que parecia parte da profissão imperial, não contribuíra para aumentar o prestígio do imperador. Dioclesiano percebeu que a autoridade imperial seria maior, e a vida do imperador mais segura, se ele fosse feito semideus.
Os recém-estabelecidos Sassânidas da Pérsia envolviam-se num espesso halo de majestade. Diocleciano copiou-lhes muitos dos rituais. O imperador já não se movia livremente entre os súditos. Vivia retirado, numa corte protocolar, e era atendido pessoalmente por eunucos, raça antes desprezada e proibida. Os que eram recebidos em audiência deviam prostrar-se e adorá-lo. Usava um diadema, calçados escarlates e mantos de púrpura. De certa forma, isso constituía uma evolução natural. A lei era quase divina aos olhos dos romanos, e o imperador era, de há muito, a fonte da lei. Mas Roma sentiu-se ofendida pelas pompas externas e orientais do despotismo. Foi entretanto Roma, e não o imperador, que mais sofreu com isso. Diocleciano governou o Oriente em Nicomédia, reconhecido como um semideus e Maximiano, seu colega ocidental, preferiu residir em Milão.
Diocleciano procurou dar verossimilitude à sua divindade, proclamando-se descendente de Júpiter, rei dos deuses, preparando dessa forma seu caminho para o panteão. Maximiano preferiu ser mais popular, embora menos exaltado, dizendo-se descendente de Hércules. Constantino, o césar do Ocidente, tentou combinar sua religião pessoal, o mitraísmo, com o culto do imperador, tornando-se descendente do Deus-Sol Apolo. (p.18-19)
Os castigos para os casos criminais eram multas e confisco da propriedade, ou mutilação. A pena de morte estava reservada, a partir de Leão III, para a traição, deserção para o inimigo, assassinato e vícios contra a natureza, e mesmo assim raramente era posta em prática. Com João II, não foi jamais usada. À mutilação era considerada como uma substituição humanitária da pena de morte e justificada pelas palavras de Cristo, que mandavam arrancar o olho ofensor e cortar o membro ofensor. Seu uso só se intensificou com Leão III, mas daí em diante foi empregada com frequência. Hoje, nossa tendência é considerá-la como um revoltante hábito bárbaro, mas o fato é que a maioria das pessoas preferiam, e ainda preferem, a mutilação à morte. As penas eram ainda mitigadas pelo direito de asilo nas igrejas, direito esse que após Leão III se aplicava a quase todos os criminosos. Constantino VII chegou a permiti-lo aos criminosos, desde que se tornassem monges, e nesse caso metade de suas propriedades ia imediatamente para as mãos dos herdeiros do morto e metade para seus próprios herdeiros, embora pudesse levar alguma coisa para o mosteiro. Até a traição era cada vez menos punida pela morte. Usualmente a segregação monástica, proporcionando ao ofensor a reclusão no presente e a salvação no futuro, era considerada como um castigo bastante, embora fosse mais prudente acrescentar-lhe a mutilação. A detenção, cara e improdutiva para o Estado, era praticamente desconhecida. A prisão estatal, o Pretório, servia frequentemente para os criminosos que aguardavam julgamento. (p.85-86)
Os deveres das diferentes tropas eram claramente estabelecidos. O exército temático guardava as fronteiras contra as invasões estrangeiras. Quando os sarracenos cruzavam a fronteira, o comandante local comunicava imediatamente o estratego dos “tema”, que avisava sem demora os “temas” vizinhos lançando sua cavalaria em perseguição dos invasores, enquanto a infantaria ocupava os lugares por onde eles teriam de passar, no regresso. Os “temas” vizinhos, nesse meio tempo, reuniam suas tropas principais e preparavam-se para convergir sobre um mesmo ponto, para onde se supunha que o inimigo iria. Se a concentração dessas forças fosse bem preparada e calculada, os invasores poderiam ser surpreendidos e cercados, como ocorreu em 863, ocasião em que o general sarraceno Omar foi sitiado no Hális pelo exército temático da Ásia. Faziam-se também contra-ataques, dando instruções a frota para devastar a costa sarracena. (p.112-113)
A cautela, na verdade, era a chave da estratégia bizantina. Os ataques dos bárbaros e dos infiéis eram tão frequentes e por vezes tão inesperados que uma política agressiva, ousada, dificilmente era praticável. O exército bizantino não era grande, como o dos sarracenos, e sua manutenção era custosa. Tinha, por isso, de ser usado do melhor modo, sem perda de vidas ou de equipamento. Todos os livros didáticos militares bizantinos insistem nas advertências contra a precipitação — os generais deviam sempre prevenir as emboscadas e ataques de surpresa e não deixar nunca seus flancos descobertos. Deviam possuir batedores de confiança e servir-se de estratagemas sempre que possível. Na verdade a ética ensinada era a menos rigorosa possível. A palavra empenhada devia ser mantida, a vida dos prisioneiros poupada, as mulheres respeitadas; os termos da paz não deviam ser impiedosos, se o inimigo lutara bravamente. Recomendavam-se, porém, as conversações insinceras para ganhar tempo e espionar o inimigo, o envio de cartas falsas aos generais inimigos, para intrigá-los com seus comandantes, e a manutenção da boa disposição das tropas narrando-se-lhes histórias de vitórias imaginárias. (p.113-114)
Tais recursos podem ter sido úteis, mas a força real dos bizantinos estava na inteligência com que enfrentavam seus vários inimigos. Aprendiam os métodos bélicos particulares de cada um dos adversários, e o melhor processo de anulá-los. Assim, os francos foram vítimas de sua precipitação, pois facilmente se deixavam levar a emboscadas. Seu abastecimento era mau, e a fome provocava deserções. Eram indisciplinados e corruptos. Evitando uma batalha direta, onde a coragem e força individual muito os ajudavam, constituíam um adversário fácil de desgastar. Os turcos, que incluíam os magiares e os petchenegos, eram também astutos, e suas tropas se constituíam de hordas de cavaleiros com armas leves. O general bizantino devia, ao enfrentá-los, precaver-se contra emboscadas e forçá-los à batalha o mais depressa possível. Seus cavaleiros pesados podiam derrotá-las sem que os turcos conseguissem atingir as linhas da infantaria bizantina. Os eslavos, infantes de armas leves, só eram perigosos em terreno montanhoso e difícil. Nas planícies, seu armamento deficiente e sua indisciplina não lhes permitiam resistir às tropas imperiais. Os sarracenos eram, portanto, os inimigos mais importantes. Podiam reunir exércitos enormes, moviam-se com grande rapidez e haviam feito estudos da arte da guerra. Continuavam, porém, um tanto desorganizados, e seu ânimo se alquebrava à derrota. Um ataque noturno num momento em que, carregados com os resultados das pilhagens, se viam obrigados a mover-se mais devagar, podia lançá-los em pânico. Também o clima os atingia, principalmente o frio e a chuva. Homem por homem, seus cavaleiros não eram adversários para os bizantinos e portanto estes não temiam a batalha aberta, exceto quando a proporção numérica era muito desfavorável. (p.114)
O navio de guerra bizantino era usualmente uma dromunda, birreme que podia ter de 100 a 300 homens. Havia birremes de outros tipos, aparentemente mais rápidas, chamadas panfilias. A nave capitânia era, no século X, uma panfília. Havia ainda galeras com um único banco de remos. Também os barcos mercantes podiam ser adaptados para a guerra. A armada de Justiniano II que lutou contra Quersônia, incluía navios de carga, e foi uma frota improvisada de velhos navios e cargueiros que derrotou os russos na invasão de 941, quando a armada imperial estava longe, no Egeu.
Conhecemos certos números quanto à magnitude da armada, em seus grandes dias. Trezentos navios foram, ao que se sabe, enviados contra o Egito em 1353, embora muitos deles possam ter sido barcos pequenos. Na expedição a Creta, em 902, a marinha imperial forneceu 60 dromundas e 40 panfílias, os “temas” cibirreota, egeu e samiano forneceram 35 dromundas e 35 panfílias, enquanto a Hélade contribuiu com 10 dromundas. Ao que parece, os “temas” calabreses mantinham sete navios em 929.
Os navios podiam dispor de aríetes, mas sua grande arma era o fogo grego, (...) (p.120-121)
Os navios podiam dispor de aríetes, mas sua grande arma era o fogo grego, substância química de composição variada e usada de formas diversas, principalmente como granada de mão que explodia e se incendiava ao atingir o navio inimigo ou, ainda, lançada em grande quantidade, pelo ar, através de catapultas. Ao que parece, a pólvora foi usada, de alguma forma, para lançar combustíveis através de tubos, a certa distância, A fórmula do fogo grego era conservada em segredo rigoroso e jamais deveria ser conhecida. Havia depósitos do fogo nas grandes cidades marítimas. A captura de Mesêmbria por Krum em 812 constituiu um grande desastre pelo fato de ter colocado nas mãos do cã da Bulgária certa quantidade do fogo. A invenção é atribuída a uma certo Calinico de Heliopolis no século VII e serviu para derrotar os árabes nos grandes sítios de Constantinopla. Entretanto, é provável que suas várias formas só tenham sido aperfeiçoadas no século IX. Leão VI fala do fogo como de uma descoberta nova. No século X, Marcos, o Grego, dá sua fórmula, um tanto vagamente; e, ao que parece, os árabes aprenderam a fabricá-lo antes das Cruzadas. O fogo só caiu em desuso no século XIV, quando foi superado pela pólvora e pelo canhão. (p.121)
As embaixadas imperiais ao estrangeiro viajavam em caravanas suntuosas, carregadas de ricos presentes, joias, ouro, sedas e brocados, que se destinavam principalmente ao monarca a cuja corte eram enviadas. Ministros influentes também podiam receber presentes. O departamento imperial de informações devia saber quais as personalidades cujo apoio valia a pena conquistar, em Pavia ou em Bagdá. Quando Nicéforo Ébano foi mandado a Bagdá em 980, recebeu instruções de ser particularmente cordial para com Adhoud ed-Dauleh, o mais importante dos conselheiros do califa. (p.124)
Junto ao Palácio havia dois outros grandes centros da vida da Cidade, a Igreja da Sabedoria Divina, Santa Sofia, e o Circo ou Hipódromo. O Hipódromo era uma vasta construção, capaz de conter umas 10.000 pessoas sentadas. Nos edifícios que se aglomeravam em torno ficavam os estábulos de todos os animais usados nas lutas, e os tugúrios dos inúmeros empregados do Circo. Os espetáculos eram gratuitos, subsidiados pelo Estado. Assistir aos jogos no Hipódromo, aos combates com animais e às corridas de carros eram as grandes distrações do populacho e, na competição entre as facções do Circo, os Azuis e os Verdes, as paixões eram tão exaltadas que chegavam a causar complicações políticas e motins. O imperador e a imperatriz eram obrigados a assistir aos espetáculos; podia-se chegar ao camarote imperial vindo diretamente do Palácio. Seus movimentos obedeciam a um ritual complicado, que prescrevia todo o processo da corrida e da premiação. Nos primeiros séculos, o Hipódromo tornou-se o local onde o imperador podia avistar-se com o povo e fazer-lhe proclamações. Ali era aclamado imperador. Foi lá que Ariadne anunciou a seus súditos quem havia escolhido para esposo e imperador; foi lá que Justiniano discutiu com os amotinados enfurecidos na sedição de Nica. Mais tarde, porém, cerca do século X, essas cenas passaram a ter lugar na grande praça fronteira ao Palácio. Foi ali que o populacho exigiu Constantino VII como imperador em 944 e Zoé como imperatriz em 1032. O Hipódromo tornava-se menos popular. Os corredores de carros dos séculos V e VI, como Porfírio, no reino de Anastásio, tinham sido os ídolos da cidade e as intrigas do Hipódromo, tais como as que cercavam o juventude de Teodoro, podiam afetar a política do império. Por volta do século IX, tudo estava mudado. O corredor de carro profissional mergulhou na obscuridade. Era o cavaleiro amador, como Basílio, o Macedônio, que atraía a atenção, ou como Filoreu, o moço de cavalariça do século X, que foi alvo da admiração de toda Bizâncio por ter galopado em redor do Circo de pé sobre o cavalo, manejando a espada com ambos as mãos. A introdução da cavalaria ocidental por Manuel Comneno fez do Hipódromo durante algum tempo o local de torneios de cavalaria. Sob os Paleólogos, foi praticamente abandonado, embora jovens príncipes e nobres o frequentassem de tempos em tempos para praticar a cavalaria e para jogar polo. (p. 150-151)
Para que um rapaz tivesse realmente êxito poderia ser sensato mandar castrá-lo, porque Bizâncio era o paraíso dos eunucos. Mesmo os pais mais nobres não hesitavam em mutilar seus filhos para promover o seu progresso, nem havia nisso nenhuma desgraça. Um eunuco não podia usar a coroa imperial nem tampouco, por sua natureza, transmitir direitos hereditários e nisso residia seu poder. Um menino nascido muito perto do trono podia ser, assim, afastado da sucessão, seguir tranquilo, atingindo altas posições. Assim Nicetas, filho de Miguel I, foi castrado quando seu pai caiu e mais tarde, apesar do seu nascimento perigoso, chegou a ser o Patriarca Inácio. Romano I castrou não apenas seu filho bastardo Basílio, que, como Paracomomeno, o Grande Camareiro, dirigiu o império durante várias décadas, mas também seu filho legítimo mais moço, Teofilacto, que ele desejava viesse a ser patriarca. Grande proporção dos patriarcas de Constantinopla era de eunucos, e os eunucos recebiam estímulos especiais no serviço civil, onde um portador castrado de um título tinha precedência sobre o competidor não-mutilado e onde muitas carreiras eram reservadas apenas aos eunucos. Mesmo no exército e na marinha o eunuco ocupava frequentemente um comando. Narses, no século VI, e Nicéforo Urano, no X, foram talvez os exemplos mais brilhantes. Aleixo I tinha um eunuco por almirante, Eustátio Cimineano, e após o desastre de Manziquerte foi um eunuco, Nicéforo, o Logóteta, que conseguiu reformar o exército. Uns poucos postos, tais como a prefeitura da cidade, lhes eram tradicionalmente vedados; entretanto, somente quando as noções ocidentais de sexo e cavalaria começaram a influenciar Bizâncio foi que se começou a estigmatizar a castração. Na realidade, foi o emprego de eunucos, de uma forte burocracia controlada por eunucos, a grande arma de Bizâncio contra a tendência feudal da concentração do poder nas mãos de uma nobreza hereditária, que provocou tantas perturbações no Ocidente. A significação dos eunucos na vida bizantina era a de que davam ao imperador uma classe dirigente na qual ele podia confiar. Não há tampouco nenhuma evidência de que suas limitações físicas deformassem seu caráter. Através da história bizantina, os eunucos não parecem mais corruptos nem intrigantes, nem menos vigorosos ou padiolas do que seus companheiros mais completos.
Nas classes inferiores, os eunucos eram mais raros, embora pudesse ser de utilidade para a clientela de um médico o fato de ser ele castrado, como neste caso poderia atender os conventos e hospitais de mulheres. Algumas instituições femininas porém eram tão estritas que só permitiam médicas. (p.158-159)
(...) A punição que as autoridades mais gostavam de infligir era a internação num convento para salvar a alma do criminoso. A pena de morte raramente era empregada. A mutilação, a penalidade comum do crime, embora horrorize os princípios modernos, constituía uma alternativa humanitária à morte e era certamente preferível à prisão ou a multas que deixavam o criminoso na miséria. Em muitas ocasiões a mercê das autoridades mitigava até castigos muito bem merecidos. A Imperatriz Teodósia não permitiu que Miguel, o Amório, fosse queimado vivo, embora ele tivesse sido, sem sombra de dúvida, julgado responsável por crime de alta traição em relação ao marido dela, Leão V. O castigo imposto aos conspiradores Ducas em 913 foi considerado ultrajado, porque diversos cúmplices foram condenados à morte e toda gente lamentou a preferência de Constantino VIII pela cegueira, mesmo quando as vítimas eram reconhecidamente criminosas: ele, porém, considerava esse castigo mais suave do que a pena de morte. Quanto aos prazeres, os bizantinos podem comparar-se muito favoravelmente com os romanos. Os presos não eram lançados aos leões no Hipódromo; as corridas de canos, e não os combates de gladiadores, eram a melhor diversão. As organizações de caridade, abrigos e hospitais não constituem indicação de um povo desalmado. (p.170)
A primeira matéria ensinada a um menino, pelos seis anos de idade, era a gramática ou “a helenização da língua”. Incluía, além da leitura e da escrita, da gramática e da sintaxe no sentido moderno, o conhecimento e comentário dos clássicos, particularmente Homero, cujas obras tinham que ser decoradas. Sinésio no século V, fala da habilidade de seu jovem sobrinho, capaz de recitar Homero (decorava cinquenta versos por dia), enquanto Psellos, no século XI, sabia a Ilíada de cor na mais tenra idade. O resultado é que todo bizantino era capaz de reconhecer uma citação de Homero. Ana Comnena, que emprega sessenta e seis na sua Alexíada, raras vezes acrescenta “como diz Homero”: era inteiramente desnecessário. Outros poetas eram lidos e até estudados, mas nenhum teve posição tão elevada e duradoura. (p.173)
O estudo do Latim estava morrendo no tempo de Justiniano, embora ele próprio fosse de língua latina. Cerca do século VIII, a ‘língua dos romanos” era o grego. Quase ninguém em Constantinopla falava o latim, enquanto ninguém em Roma, mesmo no tempo de Gregório, o Grande, falava o grego. No século IX, o próprio erudito Fócio não falava latim. Às letras latinas ainda eram empregadas, porém, na cunhagem de moedas, mesmo no tempo de Alexandre, e aclamações latinas deturpadas eram lançadas nas cerimônias do Estado, No século X houve um reflorescimento dos estudos latinos, coincidindo com um reflorescimento do grego em Roma — nomes gregos cristãos, tais como Teofilacto e Teodora ficaram então na moda. Por volta do século X, o conhecimento do latim não era invulgar em Constantinopla. Romano III falava latim; Psellos afirmava conhecer essa língua; e o seu conhecimento era obrigatório para o professor de Direito da Universidade de Constantino IX. As cartas de Aleixo I para o Monte Cassino são escritas num latim surpreendentemente ruim — é possível que se trate de simples rascunhos. Ana Comnena aparentemente não sabia latim nem tampouco, com certeza, seu sobrinho Manuel I, embora filho este de mãe húngara. Mas sua mulher, uma princesa francesa de Antióquia, sabia ambas as línguas e pegou em flagrante um intérprete que estava tentando enganá-lo. A conquista latina forçosamente tornou mais vulgar o conhecimento do latim e no tempo dos Paleólogos diversos gregos, tal como Leão Coríntio, traduziam obras gregas — principalmente hagiográficas — para o latim. (p.179-180)
Moacir tem 37 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.