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A Medicina na Antiga Mesopotâmia - Tratamento e Prevenção

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Capa do artigo: A Medicina na Antiga Mesopotâmia - Tratamento e Prevenção

Amuleto de Lamashtu em obsidiana. Museu Britânico. Mais detalhes na galeria.

Como tratavam as doenças?

O que é importante lembrar, quando nos referimos aos tratamentos médicos antes do surgimento da medicina moderna, é que a maioria das doenças são limitadas: ou a pessoa se recupera ou morre.  A recuperação muitas vezes acontece de forma natural, sendo um resultado da luta dos anticorpos do corpo contra o agente causador da doença.  E mesmo os remédios produzidos pela farmacologia moderna, em muitos casos, servem apenas para aliviar os sintomas.

Os mesopotâmicos costumavam afastar os doentes do convívio com outras pessoas, com temor de que ocorresse uma transferência espiritual daquilo que havia afligido o doente. Esse foi um conhecimento que surgiu, provavelmente, a partir do contato com alguma doença contagiosa.

Os doentes eram atendidos em casa, o médico que ia até eles.

As formas mais comuns de tratamentos eram a partir do uso de ervas medicinais e através de encantamentos:

Ervas medicinais

É provável que boa parte dessas ervas fosse ineficiente, tendo apenas resultados psicológicos através do efeito placebo. No entanto, através de um conhecimento baseado em experiências anteriores, também se difundiu a utilização de algumas ervas com eficácia comprovada.

Essas ervas eram usadas em problemas gastro-intestinais, dermatológicos e respiratórios. E como sabemos, por testes em medicina natural na atualidade, muitas delas realmente funcionam. Por exemplo, vinho e mel já foram capazes de aliviar sintomas em experimentos modernos. Além disso, há diversos produtos da medicina natural que tem poder antibiótico e anti-séptico; e algumas plantas são laxantes naturais ou forçadoras de vômito (devido ao seu alto teor tóxico).

As ervas receitadas eram ingeridas, passadas no corpo ou inseridas em algum orifício do doente. Também eram recomendadas posições relaxantes, massagens, pomadas e uso de água fria e água quente, e aplicação de dietas.

" É provável que os remédios caseiros tenham sido administrados em muitos casos, e provavelmente eram tratamentos tradicionais bastante simples, utilizando medicamentos que não apresentavam riscos incomuns. Os textos médicos, no entanto, refletem apenas as medidas tomadas pelos curandeiros profissionais. Os vários inventários de farmacêuticos que foram preservados podem indicar, no entanto, que muitos dos ingredientes mais comumente utilizados estavam prontamente disponíveis para quem os procurava, quer um curador profissional os tivesse prescrito para uma doença específica ou não. " (BIGGS, 2005, p.2)

Somente algumas dessas ervas puderam ser identificadas, a maioria dos nomes é desconhecida e se mantém um mistério.

Uma outra prática que vale a pena ser citada. Diversas substâncias usadas como remédio também eram lançadas ao fogo durante encantamentos, com a crença de que o que era bom para os humanos, seria ruim para os espíritos maléficos causadores da aflição.

Os encantamentos

A farmacopedia de plantas e mineiras não fugia da característica supersticiosa da cultura da época. Muitos remédios eram prescritos para serem tomados a uma determinada hora do dia (os augúrios seriam melhores) ou quando determinada estrela estivesse em uma certa posição.

Encantamentos e rituais mágicos eram utilizados quase sempre no tratamento de doenças, já que havia a crença de que a doença era gerada pela ação de uma entidade sobrenatural. Logo, muitos tratamentos visavam identificar essa  entidade e fazer o doente se reconciliar com ela (no caso de ser um fantasma) ou expulsá-la (no caso de ser um demônio).

O uso de ervas medicinais com propriedades laxantes, e a realização de lavagens intestinais, também era comum. O objetivo: expulsar a coisa ruim que existia dentro do corpo. Sempre lembrando que, para esse povo, essa "coisa" sempre possuía um caráter sobrenatural.

Como era a prevenção de doenças?

Uma das principais formas de prevenção de doenças era de natureza sobrenatural. O uso de amuletos era muito popular, com um dos lados mostrando a figura de um demônio, e o outro uma prece protetora (confira foto abaixo). Muitos selos cilíndricos dessa época também realizavam uma função dupla: ser a assinatura do seu portador e atuar como um amuleto protetor.

Amuleto neo-assírio em obsidiana do demônio Lamashtu, cerca de século 8-7 a.C. Christie's Image. Lot 215.

Sabemos que algumas cidades da Mesopotâmia contavam com complexos para lidar com os dejetos humanos. Sistemas de esgoto existiam e drenavam a urina e as fezes por canos de terracota. Não sabemos se essa prática foi realizado com objetivos sanitários ou estéticos. Mas é provável que tenham havido benefícios em termos de saúde pública.

A adivinhação também poderia ser usada com fins preventivos:

"A adivinhação, bem como os encantamentos, faziam parte do ritual médico. Porém, enquanto o encantamento era utilizado para uma situação já existente, como processo curativo, de modo a expulsar os espíritos malignos do doente, as práticas divinatórias eram uma espécie de medicina preventiva, em que se procurava antever o futuro, possibilitando a cada indivíduo preparar-se contra um mal pré-determinado." (MARTINS E SILVA, 2009, p.851)

Conclusão

Nessa pequena série de artigos, tentei resumir ao máximo os detalhes mais importantes da medicina no período final da história da Mesopotâmia. Deixando bem clara a mistura de superstição e conhecimento empírico, que foi um padrão da história da humanidade até a revolução científica do século 16.

A limitação médica era vista como natural, nos manuais médicos várias doenças seguem o seguinte padrão:  "Se um homem tiver (descrição de uma determina doença) ele irá morrer".  Um texto médico também trazia a inscrição "Se nem a medicina nem a magia trouxerem a cura..." Mostrando que embora se usasse a magia como parte do processo médico, havia uma consciência da distinção das duas áreas.

Mas, mesmo com suas limitações, a medicina mesopotâmica gozava de um certo prestígio:

"A popularidade e prestígio que a medicina Mesopotâmica granjeou junto de outras comunidades foram confirmados por alguns relatos. Por exemplo, não obstante a medicina Egípcia ser a mais evoluída na época, é sabido que o faraó Amenophis III foi tratado por um asû enviado pelo soberano da Babilônia. Ainda no século XIII a.C. outros médicos foram destacados, com a idêntica finalidade, para a corte de monarcas Hititas." (MARTINS E SILVA, 2010, p.139)

Foto de membro da equipe do site: Moacir Führ
Escrito por Moacir Führ

Moacir tem 37 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.

Galeria de imagens 1 de 9
Amuleto de Lamashtu em obsidiana

Amuleto neo-assírio em obsidiana do demônio Lamashtu, cerca de século 8-7 a.C. Christie's Image. Lot 215.

Amuleto neo-assírio

Amuleto com o demônio Lamashtu com uma inscrição em cuneiforme incompleta. Cerca de 800-550 a.C. Museu Britânico. N° 117759

Amuleto neo-babilônico ou neo-assírio

Amuleto de pedra verde mosqueado inscrito com lista de feitiços com o nome de Lamashtu incompleta. Cerca de 800-550 a.C. Museu Britânico. N° 128857

A tábua do Fígado

Tábua de argila completa com modelo de fígado de ovelha. Provavelmente usado para instruir estudantes. Cada quadrado descreve a implicação de haver alguma aparição naquela posição. 55 quadrados (frente e verso). Cerca de 1900-1600 a.C. Tamanho: 14.6 x 14.6 cm. Museu Britânico. N° 92668

Encanto para deusa Gula

Tábua de argila com texto de encantamento endereço a deusa Gula e a Marduk - divindades associadas com a cura - pede a ajuda para curar um paciente, que foi atacado por um fantasma. É provável que esse texto veio de Sippar e fazia parte de um arquivo de textos médicos. Cerca de 600 a.C. Tamanho: 5 x 6.3 cm. MET. N° 86.11.130

Texto médico

Tábua de argila em cuneiforme com texto médico. Cerca de 600-400 a.C. Tamanho: 7.6 x 5 cm. Museu Britânico. N° 30918

Fragmentos da literatura médica

Fragmentos de tábua de argila com partes de inscrições da literatura médica com encantamentos. Cerca de 600 a.C. Museu Britânico. N° 132097

Prescrição médica

Tábua de argila em cuneiforme com prescrição médica/mágica contra demônios e doenças. Lista receitas de várias plantas, e instruções para criar estátuas mágicas. Cerca de 500 a.C. Tamanho: 17 x 10 cm. Museu Britânico. N° 40183

Tábua médica

Tábua de argila com inscrição média em cuneiforme. Encontrada na cidade de Nippur. Tamanho: 15.4 x 9.3 cm. Museu Penn. N° B14221

Fontes bibiliográficas
  • BIGGS RS: Medicine, surgery, and public health in Ancient Mesopotamia. J. Assyr Acad Studies 2005;19:1-19
  • MARTINS E SILVA, J.: Medicina na Mesopotâmia Antiga (1° Parte). Acta Med Port 2009;22:841-854
  • MARTINS E SILVA, J.: Medicina na Mesopotâmia Antiga (2° Parte). Acta Med Port 2010;23:125-140
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