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Plantação e uso de arado de bois na Mesopotâmia. No plano de fundo barcos navegando pelo Eufrates com zigurate se destacando na paisagem da cidade. Ilustração moderna, autor desconhecido.
A Babilônia descrita no Código de Hamurabi é uma sociedade majoritariamente agrícola. Muitos artigos do código tratam de relações comerciais, mas a imensa maioria versa de questões ligadas a terra e ao plantio.
O código também expõe uma sociedade em que o palácio era altamente interventor na economia. Fazendo tabelação de preços e regulamentando a prestação de serviços, com punições severas para profissionais negligentes.
Nesse artigo discutiremos diversas questões ligadas a economia da Babilônia no século 18 a.C. Começando com a questão da terra, e seguindo com a utilização de animais nas atividades agrícolas, as práticas de empréstimos, o comércio e a navegação, a moeda, o sistema de medidas e, ao final, apresentaremos uma tabela de preços de produtos e serviços, para uma visão geral sobre a estrutura econômica da época.
Todas as informações apresentadas foram discutidas em algum momento na versão comentada do Código de Hamurabi, publicado por Emanuel Bouzon. Para mais informações consulte a bibliografia desse artigo.
A questão da terra não é muito detalhada no Código de Hamurabi. As leis deixam clara a existência da propriedade privada de terras, casas, pomares e bens móveis; uma vez que todas essas propriedades poderiam ser legadas aos filhos através de herança, ou até vendidas.
Mas o código também descreve a existência de um outro tipo de terra, a terra de serviço ilkum. Segundo Bouzon essas eram " parcelas de terra destinadas a funcionários do palácio a título de pagamento pelos serviços prestados" (BOUZON, 1990, n.p).
Esse tipo de propriedade é citada nos artigos 35, 38, 40 ,41. As terras de serviço ilkum eram inalienáveis. O artigo 40 até prevê que uma sacerdotisa naditum, um mercador e um 'ilkum ahum' poderiam vendê-los, mas desde que garantissem que o comprador assumisse o serviço que estava ligado a posse da propriedade.
Além da terra de serviço ilkum, em outro texto Bouzon descreve um segundo tipo de propriedade: a eqel biltim. Essas seriam "terras do palácio que eram alugadas a particulares e pelas quais o palácio recebia uma parte da produção estipulada no contrato de aluguel" (BOUZON, 1990, n.p).
A economia mesopotâmica, baseada na agricultura, era bastante dependente do boi que, com a utilização do arado, era usado para lavrar as terras. Os artigos 241 a 249 do Código de Hamurabi traziam leis regulamentando o empréstimo e a locação de bois e jumentos. Os artigos 259 e 260 também previam punições severas para roubo de arados e ferramentas agrícolas.
O código tabela os valores máximos de preços de aluguel, e deixa clara a responsabilidade do locatário, que estava sujeito a diversas punições financeiras, caso o boi fosse machucado ou morresse enquanto estivesse em sua posse. O artigo que chama mais atenção é o 244, que decreta:
244 - Se um awilum alugou um boi ou um jumento e um leão matou-o, em campo aberto, (a perda será) de seu proprietário (BOUZON, 2003, p.202)
A simples existência de uma legislação específica para casos como esse, é um atestado de que a morte de animais domesticados causada por leões selvagens não era algo exatamente atípico na Mesopotâmia.
Mas o próprio boi também é um animal que pode ser perigoso se deixado solto sem supervisão. Os artigos 250, 251 e 252 definiam o pagamento de multas caso um boi solto matesse uma pessoa. A pena era o pagamento de uma quantia em prata: 250g em caso de awilum morto e 166g em caso de escravo (trabalharemos a questão da moeda no próximo artigo).
A existência de uma classe de comerciantes (tamkarum) é destacada pelo código. O mercador parece ter sido um elemento importante para a economia da época, sendo responsável, não só pelo comércio de produtos entre cidades, mas atuando também como uma espécie de credor.
Os artigos 115 a 119 mostram que os empréstimos eram vistos com muita seriedade. O mercador que não recebesse seu pagamento, poderia levar uma pessoa da casa do devedor como garantia, até que o pagamento fosse realizado. O awilum devedor normalmente daria um escravo como garantia, se possuisse algum, caso contrário, poderia ser obrigado a entregar uma filha ou outro membro da família.
É nesse ponto que o código cita a escravidão por dívidas. O artigo 117 estabelece que a escravidão por dívida só poderia durar 3 anos. Fica claro que os empréstimos concedidos por mercadores, e não pagos, poderiam ser o motivo da ruína de um awilum.
O Código de Hamurabi também relata a existência de um comércio varejista. Taberneiras (sabitum) são citadas nas leis 108 a 111. Segundo Emanuel Bouzon:
Embora sabitum tenha sido comumente traduzido por taberneira, deve-se entender a sabitum como a proprietária de um pequeno estabelecimento, onde, além de bebidas alcoólicas, vendiam-se, também, alimentos e pequenos objetos (BOUZON, 2003, p.124)
O transporte entre as cidades era principalmente por via fluvial, e o porto (karum) se tornou um importante centro de negócios. Logo, os barcos desempenhavam um importante papel na economia. Os artigos 234 a 240 tratam desse tipo de transporte, dando um enfoque especial nos valores de aluguel e punições em caso de negligência do barqueiro.
O comércio internacional também era realizado através de caravanas de jumentos. Importante lembrar que na época de Hamurabi (século 18 a.C.), ainda não existiam cavalos e camelos na Mesopotâmia.
Moacir tem 37 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.