676 - Juba rei da Mauritânia, príncipe muito instruído, autor de um grande número de obras perdidas. Vive u no tempo de Augusto. Escreveu em grego e. por causa disso. Plutarco o conta entre os escritores dessa nação.
585 visualizações | 2,9 páginas | 1603 palavras | 0 comentário(s)
Depois de relatar as vidas do grego Pelôpidas (420-364 a.C.) e do romano Marcelo (270-208 a.C.), Plutarco traça aqui uma comparação dessas duas personalidades do mundo antigo. Esse texto faz parte da série de biografias escritas por Plutarco (c. 46-120), um historiador grego que viveu no Império Romano. Na série Vidas Paralelas, o autor compara vários nomes da história grega com seus equivalentes romanos.
I. Estes são os fatos que me pareceram mais dignos de memória, nas vidas de Pelópidas e de Marcelo, sendo seus costumes e suas naturezas, pensando bem, iguais e semelhantes, porque ambos foram valentes, laboriosos, magnânimos e corajosos. Poderia haver esta única diferença: Marcelo, em diversas cidades que tomou de assalto, fez grandes carnificinas e espalhou muito sangue humano, enquanto Epaminondas e Pelópidas jamais mataram homem que houvessem vencido, nem escravizaram cidade alguma que tivessem tomado e a opinião geral é que os tebanos não tratariam tão cruelmente os orcomenos, como fizeram, se um deles ou os dois estivessem presentes.
II. Mas, quanto aos feitos, cabe a Marcelo uma grande e admirável proeza de ter desfeito as poderosas tropas de gauleses, de infantaria e de cavalaria, com tão poucos soldados de cavalaria que levava com ele, da mesma forma que, com sua própria mão, matou sobre o campo o chefe dos inimigos ao que Pelópidas não pôde concorrer, pois procurando matar o tirano de Feres, foi ele mesmo morto primeiro e sofreu o que havia desejado fazer. Todavia, podem opor a este ato as batalhas de Leutres e de Tegira, que foram dois combates memoráveis e gloriosos, mas em compensação não se poderia alegar proeza alguma de Marcelo que seja igual, que mereça ser comparada ao que fez Pelópidas na sua volta do exílio, quando matou os tiranos que retinham Tebas na escravidão, pois foi isto um ato de astúcia, de surpresa, e sem igual, o maior e o mais digno de memória que jamais houve. É bem verdade que Marcelo tinha o que fazer com Aníbal, que era seu inimigo bastante perigoso e muito temível, mas também os tebanos tinham o que fazer aos lacedemônios, os quais por certo cederam a Pelópidas na batalha de Tegira e na de Leutres, quando Marcelo não venceu Aníbal uma só vez, assim como escreve Políbio, mas ficou sempre invencível até o dia em que Cipião o desfez em batalha.
III. Todavia, juntamos mais fé no que escrevem César, Lívio, Cornélio Nepos e entre os gregos o rei Juba676, que Marcelo tenha desfeito algumas vezes as tropas de Aníbal, mas não foram nunca rupturas de grande consequência e parece terem sido devidas a algum engano do Africano, do que outra coisa, o que no entanto foi meritoriamente e com razão, grandemente louvado e considerado por haver de tal maneira disposto o coração dos romanos que quisessem esperar e fazer frente ao cartaginês, depois de tantas derrotas dos exércitos romanos, tantos comandantes de exército mortos em batalha e um tão perigoso estremecimento de todo o império. Pois aquele que em lugar do receio e do terror, faz renascer a coragem dos soldados e o desejo e o ardor de se encontrarem com o inimigo, o que os assegura e encoraja até não ceder mais facilmente a vitória mas a combater e discutir virtuosamente, isso só fez Marcelo; porque em vez de já estarem todos habituados, pela longa demora de suas perdas e desgraças, a considerar-se felizes quando podiam salvar com rapidez e escapar das mãos de Aníbal, ensinou-lhes a terem vergonha de se salvar no caminho, de não querer confessar por terem sido impulsionados a recuar e por se sentirem ofendidos quando se retiravam sem haver vencido e desfeito seus inimigos. Nesse sentido Pelópidas não foi nunca assim rompido em batalha, quando capitão-comandante. Assim, Marcelo ganhou mais que nenhum outro capitão de seu tempo e poderia parecer que o grande número de vitórias de um viria a igualar-se e compensar com o não ter sido jamais vencido do outro.
IV. É verdade que Marcelo tomou a cidade de Siracusa e Pelópidas quase tomou a de Esparta, mas eu considero maior proeza o ter chegado tão perto de Esparta, como fez, e haver passado o primeiro o rio Eurotas com as armas, o que jamais inimigo algum havia feito, que dependia da vontade do outro tomar toda a Sicília; a não ser que alguém queira se opor e dizer que este feito pertence a Epaminondas e não a Pelópidas, como também ainda obteve a vitória de Leutres, quando não há pessoa alguma que possa pretender ter parte na glória dos feitos de Marcelo; pois tomou Siracusa estando sozinho como capitão em chefe, derrotou os gauleses sem seu companheiro e fez frente a Aníbal, sem que pessoa alguma o ajudasse ou o socorresse nisto, pois ao contrário, todos os outros o desviavam, e foi ele o primeiro que mudou o estilo de guerrear, que os capitães romanos usavam nesse tempo e foi ele o primeiro a ensinar aos seus a ousar mostrar o rosto ao inimigo.
V. Quanto à sua morte, não louvo a de um nem do outro e estou no meu coração desgostoso e picado pela maneira estranha como morreram todos os dois; em oposto, encanto-me como foi possível que Aníbal em tantas batalhas onde se encontrava, que seria até desagradável somente o enumerá-las, não tenha nunca ficado ferido, e louvo singularmente um feito de Crisanto, que Xenofonte narra no livro da instituição de Ciro, dizendo que já tendo levantado a espada para ferir um dos inimigos, quando ouviu a trombeta tocando a retirada, retirou-se delicadamente e modestamente sem lhe fazer mal. Todavia, parece que Pelópidas seja mais desculpado, pois além de ser quente no ardor da batalha, tinha um ódio justo que o induzia a querer vingar-se, pois como diz o poeta Eurípides:
O melhor é que um chefe de hoste, para sua glória Tendo vencido, sobreviva sua vitória, Ou bem se está morto na terra abatido, Que morra ao menos como homem virtuoso.
Assim, a morte daquele que morre desta maneira não pode ser chamada acidente nem inconveniência, mas ato de virtude, pois além do justo ardor que tinha Pelópidas, havia ainda uma outra coisa que o atraía, não sem grande razão a fazer o que fez; é que via a consumação de sua vitória na morte do tirano, pois ficaria bem descontente em procurar alhures outra ocasião tão digna e tão gloriosa para empregar e mostrar sua coragem como ali. Ao contrário, Marcelo, sem nenhuma necessidade urgente, sem aquele furor e ardor que surpreende muitas vezes os homens valentes no meio do combate e os transporta para fora de seu entendimento, ‘foi pessoalmente precipitar-se no meio do perigo, onde morreu, não como capitão mas como cavaleiro e precursor, abandonando seus três triunfos, seus cinco consulados, seus despojos e troféus, que havia de sua própria mão conquistado e ganho dos reis, para aventureiros espanhóis e numídios, os quais pelo soldo vendiam seu sangue e sua vida aos cartagineses, de sorte que creio que eles ficaram com inveja de si mesmos, por uma proeza tão grande e tão feliz, fazendo morrer entre os precursores e descobridores fregelâneos, o maior personagem, o homem mais valente e mais considerado dos romanos.
VI. Todavia, não desejo que pensem que digo isto para censurar ou acusar a memória desses dois grandes personagens, mas isto deve ser tomado como um lamento e uma demonstração franca feita a eles mesmos e à sua própria coragem, a qual para ser demonstrada, fizeram perecer todas as outras virtudes, abandonando sem que fosse necessário, muito indiscretamente suas pessoas e suas vidas, como se tivessem desejado e quisessem morrer por eles, mais cedo que pelo seu país, por seus amigos e aliados. Mas ainda depois de suas mortes, Pelópidas foi exumado pelos aliados e confederados de Tebas, pelos quais havia sido morto e Marcelo o foi pelos próprios inimigos. Se um agiu bem e praticou o que era desejável em tal caso, no outro é bem maior e admirável que o inimigo mesmo reverencie e honre a virtude que destruiu e não que o amigo mostre prova de amizade. Porque o inimigo nada tem que o obrigue a honrar seu inimigo morto, senão a admiração de sua virtude, e o amigo, muitas vezes o faz, mais pelo proveito e utilidade que recebeu, do que pela afeição que devota à sua virtude.