MENDONÇA, Sonia Regina de. O Mundo Carolíngio. São Paulo: Brasiliense, 1985.
O Mundo Carolíngio é uma obra sobre o Reino Franco, que ocupou a antiga província romana da Gália no final do século 5, após a queda do Império Romano, e que deu origem ao Reino da França. Essa obra trata do período que vai da sua criação, com a conversão de Clóvis em 481, até o Tratado de Verdun em 843. Embora o título da obra faça referência a dinastia dos Carolíngios (r.751-987), várias páginas também são dedicadas a dinastia dos Merovíngios (r.481-751).
Essa obra não apresenta a história dos eventos políticos desse período. O objetivo é expor dados básicos sobre as estruturas econômicas, políticas e sociais dessa sociedade. É um livro pequeno e de leitura rápida. Eu li a obra em apenas dois dias sem maiores problemas.
Infelizmente, mesmo sendo uma obra curta e de caráter introdutório, ela peca pelo linguajar desnecessariamente complicado. Mas ao longo do livro o texto vai se tornando mais digerível, e a leitura se torna mais agradável. A seguir farei um resumo dos dois capítulos da obra e depois terminarei com minhas conclusões sobre o livro:
As Estruturas na Alta Idade Média Ocidental
Há três temas principais nesse capítulo: a Economia, a Sociedade e o Cristianismo. Na parte de economia a autora fala sobre o funcionamento dos domínios (o modelo agrícola franco) e sobre o comércio na região. O tal domínio não é um sinônimo de feudalismo, aquilo que viria a se tornar o feudalismo, estava nessa época dando seus primeiros passos.
Primeiro a autora foca muito em dois pontos: a baixa produtividade desse novo sistema e as vantagens do servo sobre o escravo. Depois faz alguns comentários sobre o comércio, nada muito especial, apenas dados meio óbvios e a já comum contestação a tese de Henri Pirenne, que parece estar em todos os livros que tratam desse período.
A tese de Pirenne, defendida na obra 'Maomé e Carlos Magno', defende que o que causou o fechamento econômico da Europa e o suposto fim do comércio, não foram as invasões bárbaras do século 5, mas a conquista do Mediterrâneo pelos muçulmanos e o domínio dos piratas árabes sobre a região, o que só ocorreu no século 8.
No texto sobre Sociedade, a autora dá destaque para as contradições da política centralizadora dos francos (baseada na descentralização) e sobre a nivelização dos trabalhadores rurais. O trecho sobre cristianismo fala da situação da Igreja após a queda de Roma, a aliança com os francos e a obra religiosa de Carlos Magno.
O Estado Carolíngio: limites e realizações
Esse capítulo já é mais interessante do que o outro, que é um pouco arrastado. São três temas: O Reino Merovíngio, o Reino Carolíngio e a Cultura do Renascimento Carolíngio. Na parte sobre os Merovíngios a autora destaca o estranho ideal por trás do "Estado" franco, que na realidade não passava de uma grande propriedade privada do rei e dos nobres. A perda do poder do rei (descentralização) já demonstrava força nesse momento e a ascensão dos Carolíngios nada mais foi que a tomada do poder pelos duques da Austrásia.
No trecho sobre o Estado Carolíngio a autora expõe o funcionamento do governo na época de Carlos Magno, destacando a luta contra as forças descentralizadoras e definindo a expansão militar como uma tentativa de solucionar esse problema. Além disso outros mecanismos também foram adotados para tentar conter essa perda de poder, mas no fim as forças centrífugas eram muito fortes e, após a morte de Carlos Magno, a descentralização foi inevitável, devido as próprias contradições internas do Estado franco. A autora define o Império Carolíngio como um “ídolo de pés de barro”: uma construção Estatal fadada ao fracasso
Na parte sobre a cultura ela cita rapidamente as reformas da Renascença Carolíngia, em especial o incentivo a escrita e a educação.
Conclusão
O ponto principal do livro são as contradições do Estado franco, que, para impedir a sua perda de poder adotou medidas que, a longo prazo, levaram ao seu fim. Diante da incapacidade de montar uma grande máquina administrativa, os reis delegaram os seus poderes para os nobres através da concessão de um beneficium, que nessa época se fundiu com o costume da vassalagem. Esse benefício incluía o direito do uso das terras, mas também o poder para recolher as taxas e impostos da região, além de ministrar a justiça. Dessa forma os nobres acabaram virando verdadeiros reis em seus domínios.
Para conter essa perda de poder, e de renda, os reis carolíngios eram obrigados a expandir seu reino através da conquista militar, dessa forma sendo capaz de conceder novos benefícios, ganhando assim os favores dos nobres, pelo menos por uma geração. Com o tempo o rei franco se distanciou cada vez mais da população, os benefícios acabaram se tornaram hereditários e, posteriormente as invasões externas e os conflitos entre nobres acabaram contribuindo para tornar o Estado franco uma mera ficção. Mesmo assim a autora destaca a importância desse império e a influência que ele teve para a formação da Europa.
Essa é uma boa obra de caráter introdutório, mas o livro mostra algumas ideias interressantes sobre as razões da decadência do império Carolíngio e traz dados úteis sobre as ações de Carlos Magno na questão religiosa, e seu papel para o fortalecimento da Igreja. Nos demais temas (sociedade e cultura) não há nada de muito novo. Por ser uma leitura rápida é uma obra que vale a pena ser conferida.
Para mais informações sobre o livro leia minhas anotações de leitura e as fotos da obra. Os links estão acima dessa análise.
Resenha publicada em 30/09/2020.
Escrita por
Moacir Führ
Moacir tem 33 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.